Painelistas debatem carga tributária nos últimos 15 anos

Fonte Sindifisco Nacional
30 Nov 2009
Tendo como tema “Transparência e controle do gasto público”, o primeiro painel do horário da tarde de quinta-feira (26/11) do Colóquio Internacional “Tributação, Desenvolvimento, Infraestrutura e Sustentabilidade – Cenários para o Brasil da Próxima Década”, promovido pela FGV (Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo, contou com a participação de advogados, representantes patronais, acadêmicos e servidores da RFB (Receita Federal do Brasil), permitindo que fosse feita uma avaliação heterogênea de como se deu a evolução da arrecadação nos últimos anos e quais as perspectivas para o futuro.O primeiro a falar foi o mediador do painel, Carlos Pelá, que é coordenador da Comissão de Estudos Tributários da Febraban (Federação Brasileira de Bancos). Após criticar o que ele chamou de falta de segurança jurídica no país, em que situações iguais são tratadas de formas diferentes em épocas diferentes, ele disse que a Febraban apóia a transparência das contas públicas e lamentou o fim da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira).“Embora os recursos nem sempre fossem para onde deveriam ir, a CPMF era uma arma muito boa de fiscalização que o Fisco perdeu”, admitiu.Plano Real – A segunda painelista foi a escritora, jornalista e assessora da FGV Maria Clara do Prado. Após fazer um levantamento de como se deu o endividamento do país desde a década de 60 até os tempos atuais, ela lembrou que Governo era o principal beneficiário da indexação da economia. “Com o fim do processo inflacionário, optou, então, pelo aumento da carga tributária” concluiu.O painelista seguinte foi o professor de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul Humberto Ávila. Ele começou sua apresentação fazendo uma provocação. “Todo mundo fica defendendo a Reforma Tributária, como se ela fosse a solução dos problemas brasileiros, mas quem disse que toda mudança é boa. Ela também pode ser ruim”, advertiu.Também criticou o afã que existe para se mudar a Constituição Federal. “A mudança na Constituição Federal não é condição nem necessária, nem suficiente, para melhorar o sistema tributário. Desde que me formei, em 1991, escuto falar em reforma, mas ela nunca ocorre. Enquanto isso, as normas infralegais vão sendo mudadas anualmente, e a maioria dessas propostas é feita pela RFB (Receita Federal do Brasil). Não que isso seja ruim, significa que o órgão tem técnicos competentes, mas a sociedade deve se capacitar para propor esse tipo de norma”, defendeu.Para o professor, o mais importante é assegurar o equilíbrio entre mudança e permanência. Para ele, a melhoria do sistema tributário requer o esforço de torná-lo mais simples e menos oneroso para o contribuinte.Arrecadação – A defesa da RFB foi feita pelo subsecretário de Fiscalização do órgão, Auditor-Fiscal Marcos Vinicius Neder de Lima, que falou sobre “Tributação e Accountability: planejamento, transparência e segurança jurídica”. “É preciso dizer que o aumento da arrecadação eliminou o déficit público, o qual, como foi dito na fala de Maria Clara Prado, era um alimentador da inflação. Temos o lado negativo, já que uma carga tributária alta inibe investimentos, mas quem vai gerir a política econômica tem de fazer escolhas”, afirmou.Neder explicou que, num prazo de quinze anos, a arrecadação administrada pela Receita Federal subiu de R$ 150 bilhões para R$ 500 bi ao ano. Para o subsecretário, esse aumento da arrecadação se deu por três fatores: uso intensivo de tecnologia, migração da tributação direta para a indireta e pelo lançamento por homologação.Um dos fatores que levou a Receita a dominar tão bem os recursos tecnológicos, segundo Neder, foi o alto nível de Auditores-Fiscais selecionados pelos concursos públicos. “No meu concurso, por exemplo, dos 30 selecionados, 28 eram engenheiros, um matemático e um advogado. Isso ajudou a dar um perfil mais tecnológico ao órgão. Apesar de a maioria, após entrar na Receita, também ter cursado uma faculdade de Direito”, pontuou.O uso da tecnologia permitiu à Receita adotar a nota fiscal eletrônica, ter um grande banco de dados, selecionar melhor os contribuintes a ser fiscalizados e trabalhar com auditoria eletrônica. Em breve, o órgão vai começar a usar o "e-processo", em que as intimações aos contribuintes serão feitas eletronicamente.O segundo aspecto, ressaltou Neder, foi introduzido por sugestão do FMI (Fundo Monetário Internacional). “No início da década de 90, assisti a uma palestra do professor Richard Bird, que está aqui, em que ele defendia o uso da tributação indireta pelos países em desenvolvimento. Foi o que fizemos aqui”, lembrou. Neder disse que esse é um tipo de imposto regressivo, pois trata de forma igual os desiguais, mas que essa foi uma posição de Governo.Por meio do lançamento por homologação, os Auditores-Fiscais foram liberados para fazer auditorias mais sofisticadas. “O lançamento por homologação é uma linha de produção que o Fisco, por amostragem, olha se está sendo seguida. E hoje, por meio da informática, é muito fácil saber quando algo sai fora dos trilhos”, exemplificou. No Brasil, 95% da arrecadação tributária ocorre de forma espontânea. “Isso se dá porque a sensação de risco da sociedade é grande, pois o Fisco se transformou num excelente Big Brother do contribuinte”, alertou.Planejamento Tributário – Citando a cartilha do FMI que aprendeu no início da década de 90, Neder elencou três fatores que levam o contribuinte a pagar sem reclamar: sentimento de que o dinheiro público está sendo gasto corretamente; sensação de que o tributo é justo, que todos os contribuintes estão sendo tratados da mesma forma, e a certeza de que um eventual deslize será punido. “Com exceção do primeiro item, acho que o Brasil atende aos outros dois requisitos”, afirmou o subsecretário.O defeito do modelo do FMI é que ele é muito regressivo. Do preço de uma passagem de ônibus, por exemplo, 55% do valor corresponde a impostos. “Porém, como aumentar a arrecadação, sem aumentar alíquotas?”, questionou Neder. Para ele, é preciso acabar com as brechas tributárias que permitem à metade das 500 maiores empresas brasileiras não pagarem imposto de renda.“Um dos princípios que sustenta a sociedade brasileira é o da legalidade cerrada. Se a pessoa atende às normas, o ato não pode ser questionado. Isso leva, no caso fiscal, ao planejamento tributário. Ou seja, a norma que foi criada para proteger a sociedade, quando levada às últimas consequências, pode criar desigualdade. É preciso remodelar o sistema para os que ganham melhor sejam atingidos pela tributação”, defendeu.MPF - Questionado pelo presidente da DS (Delegacia Sindical) Espírito Santo, Adriano Correa, por que a proposta de abolição do MPF (Mandado de Procedimento Fiscal) estava parada na RFB, Neder respondeu que a proposta, apresentada pela gestão anterior da RFB, estava sendo discutida na Casa Civil, e explicou que ela não era de abolição do MPF, mas de substituição por outro instrumento.Disse, ainda, que não se opunha à mudança, mas entendia que a fiscalização tributária deveria atender a três princípios: capacitação do Auditor-Fiscal, utilização de tecnologia e controle. “O supervisor tem de acompanhar o que o fiscal está fazendo. Isso é transparência. Princípio, aliás, que deve nortear o serviço público”, argumentou.Desoneração – O último palestrante do painel foi o presidente da CNC (Confederação Nacional do Comércio), Luigi Nesi. Ele adiantou parte de uma proposta que a entidade deve apresentar até o final deste ano no Congresso Nacional para desoneração da folha de pagamento. Segundo a proposta, os tributos incidentes sobre a folha seriam substituídos por uma contribuição sobre movimentação financeira. No caso dos salários, os patrões pagariam aos empregados o equivalente ao que fosse descontado referente ao tributo.“Se essa proposta for efetivada, os antigos fiscais da previdência deveriam ser realocados na fiscalização sobre bancos. Em dez bancos seria possível arrecadar o que hoje se recolhe de todas as empresas para fins de contribuição previdenciária”, previu.A proposta provocou reações na plateia. Alguns Auditores-Fiscais presentes afirmaram temer que os recursos da Previdência fossem desvinculados. Luigi Nesi lembrou que a proposta ainda estava em discussão e que a confederação se achava aberta ao debate.