A extraordinária arrecadação deste ano

Fonte Valor Econômico
22 Set 2011

Houve um grande alvoroço, no fim do ano passado, quando os parlamentares da Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional elevaram a previsão de receita da União para 2011 em R$ 22,8 bilhões. Muitos consideraram a estimativa irrealista e destinada unicamente a acomodar o aumento de gastos que deputados e senadores fizeram no Orçamento. Esta semana, o governo surpreendeu o próprio Congresso ao informar que sua nova previsão para a receita da União é superior àquela que está na lei orçamentária em R$ 6,9 bilhões. O "exagero" cometido pelos parlamentares na reestimativa da receita foi um dos argumentos utilizados pelo governo para fazer um corte de R$ 50,1 bilhões nas despesas orçamentárias e, dessa forma, garantir a obtenção da meta de superávit primário deste ano. O decreto 7.445, de março, que sacramentou o contingenciamento, reduziu a previsão da receita que está no Orçamento, de R$ 990,5 bilhões para R$ 971,4 bilhões - um corte de R$ 19,1 bilhões. Outra razão para o corte de R$ 50,1 bilhões foi que, na proposta orçamentária que encaminhou ao Congresso, o governo tinha descontado os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) da meta de superávit primário, no montante de R$ 32 bilhões. Ou seja, a proposta orçamentária para 2011 foi elaborada prevendo um superávit primário do governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) de apenas R$ 49,8 bilhões e não de R$ 81,8 bilhões, que é a "meta cheia" para o ano, sem os desconto do PAC. Previsão de receita já é maior do que a do Orçamento Como a inflação deu uma acelerada no início deste ano, o governo decidiu fazer um esforço fiscal maior do que aquele que tinha programado inicialmente e perseguir a "meta cheia". Com isso, o governo esperava que a política fiscal desse uma ajuda ao Banco Central na redução da demanda, o que contribuiria para um menor ritmo de elevação dos preços. Ajustar as contas públicas a uma menor receita e à "meta cheia" foram as razões para o corte de R$ 50,1 bilhões. O relatório de avaliação de receitas e despesas do quarto bimestre, encaminhado pelo governo ao Congresso na segunda-feira passada, apresentou números surpreendentes para a arrecadação este ano. O governo anunciou que sua previsão para a receita da União em 2011 foi elevada em R$ 25 bilhões, em relação à estimativa que consta do relatório do terceiro bimestre. Ou seja, em dois meses, a previsão oficial aumentou 0,6% do Produto Interno Bruto (PIB). O governo trabalha agora com uma estimativa de R$ 997,4 bilhões para a receita primária total, o que é R$ 6,9 bilhões a mais do que a previsão que consta da lei orçamentária e R$ 26 bilhões a mais do que a estimativa que consta do decreto de março, de contingenciamento. Dessa receita excepcional, o governo utilizou R$ 10 bilhões para aumentar a meta de superávit primário deste ano, que agora será de R$ 91,8 bilhões. Esse foi o esforço adicional anunciado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, no início deste mês. Mas isso ainda é apenas uma intenção, pois falta o governo formalizar esse compromisso com o envio de um projeto de lei ao Congresso, alterando a meta fiscal definida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Outros R$ 14,6 bilhões do aumento da receita foram utilizados pelo governo para elevar as despesas deste ano, principalmente aquelas relacionadas com os benefícios previdenciários e com o seguro desemprego e abono salarial. O R$ 1,4 bilhão restante é a parte que cabe aos Estados e municípios pelo aumento da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Essa elevação da despesa significa que o corte não é mais de R$ 50,1 bilhões ou de R$ 50,6 bilhões, como passou a ser tratado a partir do relatório de avaliação do primeiro bimestre, divulgado no fim de março. O corte é agora de R$ 36 bilhões (R$ 50,6 bilhões menos R$ 14,6 bilhões). Em 2010, o governo só conseguiu atingir a meta de superávit primário de 2,15% do PIB por causa da operação de capitalização da Petrobras, com a venda de petróleo do pré-sal para a empresa, que terminou com um saldo de R$ 31,9 bilhões nos cofres do Tesouro. Foi com esse dinheiro que o governo conseguiu cumprir a meta fiscal de 2010. Por isso, havia muita descrença entre os analistas sobre a capacidade do governo de obter o superávit primário deste ano, uma vez que não seria possível repetir uma operação parecida com a da capitalização da Petrobras. O aspecto interessante é que a própria Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) já sabia que haveria "surpresas" na arrecadação deste ano. Tanto é assim que, na proposta orçamentária para 2011, enviada ao Congresso em agosto de 2010, a RFB informou que esperava R$ 31 bilhões em receitas "atípicas" - ou seja, de receitas extras, decorrentes de eventos tais como decisões judiciais, parcelamento de dívidas etc. No relatório de avaliação do primeiro bimestre, o governo reduziu a estimativa de receitas atípicas para R$ 12,5 bilhões. Agora, sabemos que a RFB estava com a razão desde o início. Ribamar Oliveira é repórter especial em Brasília e escreve às quintas-feiras.