Unafisco alerta ministro da Fazenda sobre os problemas do PL 536/07

23 Mar 2007
A retirada da autoridade e das atribuições dos AFRFs, bem como a impropriedade de se abrir possibilidade de o contribuinte pagar os tributos com acréscimos moratórios antes do auto de infração, contidas no Projeto de Lei 536/07, de autoria do Executivo, levaram o Unafisco Sindical a encaminhar um alerta, ontem (22/03), ao ministro da Fazenda Guido Mantega, pedindo uma audiência específica para discutir o assunto. O referido PL foi apresentado na noite de quarta-feira (21/03) pelo governo como alternativa ao veto da emenda 3 na lei da fusão dos Fiscos. Leia abaixo, a íntegra da carta encaminhada ao ministro. Brasília, 22 de março de 2007. Carta PR 96/2007 A Sua Excelência o Senhor GUIDO MANTEGAMinistro da FazendaBrasília-DF Senhor Ministro, O Unafisco Sindical – Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal tem sido, ao longo da história, defensor intransigente do interesse do Estado nas questões tributárias. Nesta condição, sentimo-nos no dever de alertar Vossa Excelência acerca dos graves problemas que advirão do Projeto de Lei nº 536/2007, encaminhado pelo Poder Executivo. O PL nº 536/2007 trata da alternativa do governo à Emenda 3 do Projeto de Lei 6.272/2005, vetada no momento da sanção presidencial. Conforme ressaltamos em correspondência anterior, a Emenda 3 foi corretamente vetada, pois padecia de grave enfermidade: não tratava de regulamentar a contratação de profissional como pessoa jurídica, apenas pretendia submeter indevidamente a legítima atuação do Poder Executivo ao crivo prévio do Poder Judiciário. Os defensores da Emenda 3 justificaram-se exaustivamente alegando que precisavam de “segurança jurídica” para este tipo de contratação. Se fosse este o caso, a forma correta seria regular a relação contratual/trabalhista e não impedir ou constranger o Estado no exercício de sua atribuição constitucional, nas áreas trabalhista, previdenciária e tributária. O PL nº 536/2007 sofre do mesmo mal, com uma série de agravantes. Com a aprovação do projeto de lei, a administração da Secretaria da Receita Federal poderia conseguir seu maior objetivo nos últimos 12 anos: transferir para si a condição de autoridade administrativa, retirando-a do Auditor-Fiscal da Receita Federal. A redação do PL não deixa dúvidas: a “autoridade administrativa”, que teria o poder de desconsiderar atos jurídicos, seria a “autoridade administrativa que instaurou o procedimento de fiscalização”. O Auditor-Fiscal da Receita Federal seria apenas o executor do procedimento fiscal, deixando de ser um agente de Estado, investido da atribuição de realizar os atos necessários emanados do Poder de Tributar, monopólio do Estado. O comando da Secretaria da Receita Federal, ainda na época do ex-secretário Everardo Maciel, propôs transformar a Secretaria da Receita Federal em autarquia e apresentou projeto de lei complementar para transferir a atribuição de lançamento de ofício do crédito tributário do cargo de AFRF para a administração da SRF. Preocupa-nos o fato de que a equipe que ainda comanda a SRF possa apresentar, no atual governo, um projeto de lei em tais moldes. Seria grave passo para o enfraquecimento estrutural e funcional da Administração Tributária. A grande questão: o poder de tributar do Estado deve ser exercido por seu corpo funcional permanente, que fez concurso público específico para este fim, ou pelo corpo político, representado pelas funções de confiança? Não está em questão se os ocupantes das funções administrativas na Secretaria da Receita Federal são Auditores-Fiscais da Receita Federal. Obrigatoriamente são AFRFs. Também não está em questão a qualificação dos colegas que estão, momentaneamente, exercendo tais funções. O corpo funcional da Secretaria da Receita Federal é de grande qualidade. Todavia, transferir as atribuições para as funções de confiança é delegar aos governos vindouros a decisão de escolher por critérios políticos que pessoas terão estas atribuições. Outra grave impropriedade é a possibilidade de o contribuinte pagar os tributos com acréscimos moratórios antes do auto de infração. Se o contribuinte tem qualquer dúvida sobre a forma de tributar certos fatos geradores e não quer correr o risco de ser surpreendido por uma fiscalização, basta formular uma consulta à SRF. Pode, inclusive, ser feita por entidades representativas de segmentos de atividades econômicas. O regular processo de consulta vincula a Administração Tributária e o contribuinte e evita a constituição de ofício do crédito tributário até que a matéria seja decidida. Caso a solução seja em desfavor da pretensão do contribuinte, este pode recolher os tributos devidos com acréscimos moratórios. Se há necessidade de segurança jurídica, um processo de consulta seria suficiente. A previsão de pagamento dos tributos apenas com acréscimos moratórios equivale à descriminalização da fraude. Neste caso, se a fraude for descoberta pela fiscalização, o contribuinte apenas pagaria o tributo como se estivesse recolhendo espontaneamente, em atraso. Portanto, essa medida constitui incentivo aos crimes contra Ordem Tributária. Destacamos que pessoas que perpetram outros crimes, como pequenos furtos, não dispõem de tamanha benevolência legal. Não procedem os argumentos de que haveria abusos por parte dos Auditores-Fiscais da Receita Federal no que tange às desconsiderações de atos ou negócios jurídicos. Os AFRFs atuam no estrito cumprimento dos mandamentos legais. Nossos atos são passíveis de revisão em recursos administrativos e judiciais. Nossos atos são controlados amiúde por dispositivos de corregedoria e revisão de procedimentos, sem mencionar o Ministério Público. O crédito tributário constituído de ofício em decorrência de procedimento de fiscalização tem a exigibilidade suspensa enquanto é julgado tanto nas instâncias administrativas quanto judiciais. Diante de todos esses fatos, solicitamos a Vossa Excelência que reveja junto ao Presidente da República o projeto de lei encaminhado, para o fortalecimento democrático e republicano da Administração Tributária e a defesa do interesse da sociedade e não daqueles que se utilizam de recursos ilícitos para fraudar o Fisco. O projeto de lei, nos termos apresentados à Câmara dos Deputados, contará com a resoluta oposição do Unafisco Sindical, em articulação com as demais entidades da sociedade civil que se mobilizaram contra a Emenda 3. Quanto àquela emenda, o governo foi sensível à argumentação da sociedade e vetou corretamente. Confiamos que haverá novamente essa sensibilidade. Solicitamos audiência com Vossa Excelência para tratar da matéria com a urgência necessária. Respeitosamente, Carlos André Soares Nogueira Presidente