Indicados defendem SRF forte e livre de interferências políticas
Na parte da sabatina propriamente dita, os indicados pelas regiões, escolhidos entre outros auditores-fiscais eleitos pela base na fase local do processo da lista tríplice, responderam a perguntas feitas pelos delegados. Em sistema de sorteio, todos os indicados tiveram chance de responder às indagações dos AFRFs que participaram da reunião do Conselho de Delegados Sindicais (CDS). A mesa do CDS registrou 56 delegados credenciados na tarde de ontem. O ex-SRF Osiris Lopes Filho teve a missão de indicar se haveria algum ponto “positivo” na criação da Receita Federal do Brasil. O colega disse que “não” e destacou uma série de fragilidades da “Super-Receita”, a começar pela falta de um sistema próprio de processamento. A exemplo da SRF, a RFB ainda será dependente do Serpro. “A matéria-prima da administração tributária é a informação, não é a arrecadação. O projeto não separa informação arrecadatória do exercício de direito. Uma das fragilidades da Receita Federal é não ter processamento próprio. A Receita Federal do Brasil tem essa fragilidade. Não solucionou essa questão do tráfego da informação”, afirmou. Osiris Lopes Filho disse, ainda, que é falsa a idéia de que a simples fusão será responsável pelo crescimento da arrecadação, como propala desde a MP 258/05 o governo federal. Ele cita o exemplo da Lei 9.393, que retirou do Incra o Imposto Territorial Rural e o transferiu para a Receita Federal. Segundo o ex-SRF, antes da mudança na legislação arrecadava-se R$ 1,5 bilhão; depois, “só houve um ano em que a arrecadação ultrapassou R$ 300 mil”. Questionado se o Mandado de Procedimento Fiscal (MPF) sobreviveria caso ele fosse indicado pela categoria para o posto de secretário da Receita Federal, o colega Celso Fernandes afirmou que a extinção do MPF deveria estar na pauta de todos os indicados pela categoria no processo da lista tríplice porque é um desejo das bases. “A revogação [do MPF] deve ser a primeira coisa a ser tratada pelo secretário. O MPF já está viciado desde o seu nascedouro. Não se pode aceitá-lo como instrumento de controle de uma prerrogativa que seria dos AFRFs”, afirmou Celso Fernandes, lembrando que o MPF, além de ser inútil, tornou-se “instrumento de terrorismo” na SRF. O AFRF Dão Real Santos, ao falar do respeito às atribuições dos AFRFs e das tentativas de retirá-las dos auditores, disse que a sociedade espera dos agentes públicos ações impessoais, autônomas e independentes e atendam rigorosamente ao que manda a lei e a Constituição Federal. A defesa das atribuições dos AFRFs e dos demais servidores públicos não é, portanto, exclusiva das categorias. “Não é um direito do auditor nem do delegado de polícia, é da sociedade”, explicou o colega. Provocado sobre o que pensa do Propessoas e da ascensão funcional dos técnicos, o AFRF Mauro Sérgio Bogéa disse que procurou documentos que registrassem as iniciativas na área de recursos humanos na SRF, mas não encontrou. “É difícil entender se é trabalho de prospecção ou já são decisões tomadas. Na avaliação da administração tributária no Brasil, a política efetiva de recursos humanos é uma fragilidade”, disse. Instado sobre a questão do conflito de interesses, de agentes públicos que deixam o posto e assumem vagas na iniciativa privada na mesma área logo após o período de quarentena, o AFRF Tadeu Matosinho foi veemente ao afirmar que a ética condena a prática e, mais, lamenta o fato de que casos recentes na estrutura da SRF tenham ficado impunes. “O pior não é ocupar cargo lá fora, é continuar exercendo o cargo indiretamente”, criticou. Constantemente cobrados quanto ao cumprimento de metas de arrecadação, os colegas perguntaram ao AFRF Leônidas Quaresma que outros critérios ele via para que se medissem os resultados do trabalho dos auditores. Leônidas Quaresma afirmou que o principal critério deveria ser o contribuinte e o seu grau de satisfação em relação ao atendimento por parte da Receita. Para ele, caso o contribuinte se sinta valorizado e entenda que os auditores lutam por uma tributação mais justa, os AFRFs serão tidos como aliados. “Poderemos tê-los do nosso lado”, acredita. O Propessoas retornou à sabatina em questão formulada ao colega Dão Real. Para ele, o programa seria bom se, de fato, tratasse de pessoas. Não é o que ocorre. Dão destaca que o que está por trás do Propessoas é a intenção de impor ao Estado brasileiro a lógica da iniciativa privada com base em conceitos neo-empresariais. O colega explicou que essas ações são ideológicas de um Estado mínimo e residual. “O modelo de Estado da Constituição Federal de 1988 é diferente, é um Estado que não é liberal, como o que está sendo construído hoje. Não é à toa que o Propessoas é tão fechado”, afirmou. O colega Mauro Bogéa disse não acreditar que a fusão dos Fiscos funcione como choque de gestão, como setores do governo federal chegaram a tratar. “Não é o fato de se consolidar atribuições que representarão nenhum ganho. No Reino Unido, onde houve a fusão dos Fiscos, houve o juízo de não se resolver as questões corporativas por lei. Atualmente, elas estão sendo discutidas. Se alguém vendeu a fusão como melhoria da efetividade da administração tributária, vendeu produto que não poderá entregar”, observou. A necessidade de uma Receita Federal mais ética e transparente foi defendida por todos os indicados. Celso Fernandes lembrou que o combate aos desvios éticos deve se centrar em todas as instâncias da SRF. Ele duvida, por exemplo, que em uma SRF com secretário indicado pela categoria haja espaço para interferências políticas. Dessa forma, ninguém se preocuparia em saber quem são os padrinhos políticos de delegado ou superintendente A ou B. “A marcha [da lista tríplice] não nos conduz para o calvário, para o martírio, mas para assumir o trono que nos foi roubado”, arrematou.