Opinião - Novo PIB, um Brasil pouco diferente
Continuamos entre os países que mais transferem recursos para o Estado.José Mauro DelellaNão. Nós não acordamos mais ricos no dia 28 de março - quando o IBGE divulgou o PIB brasileiro calculado pela nova (e melhor) metodologia mostrando valores aproximadamente 10% superiores aos que eram obtidos pela sistemática antiga. Mas, sem dúvida, acordamos sabendo que vivemos num país que é um pouco diferente daquele que imaginávamos até a véspera. E, de forma geral, para melhor.Crescemos mais: a taxa média de expansão do PIB brasileiro no período compreendido entre 1995 e 2006 subiu de 2,4% para 2,7%. Se tomarmos apenas os últimos cinco anos (2002-2006), a revisão foi ainda mais expressiva: de 2,7% para 3,3% ao ano. Ainda é pouco, inferior à média mundial. Mas mostra que nosso aproveitamento do extraordinário ciclo benigno dos últimos anos foi um pouco melhor do que acreditávamos, ao mesmo tempo que sugere termos um maior crescimento potencial.Consumimos mais: o consumo agregado passou a representar 83,5% do total do PIB (contra 80% segundo a metodologia anterior), o que nos aproxima de economias maduras (como a americana e a maior parte das européias) e distancia da maior parte dos emergentes (dos asiáticos e também da China). O consumo das famílias é elevado (o que é bom); o consumo do governo, também (o que é mau).Investimos menos: se a taxa de investimento calculada pela metodologia antiga (em torno de 20-21% do PIB) já era baixa, pela nova é ainda menor: apenas 16,8% do PIB em 2006. Nível baixíssimo, que nos coloca entre os países que menos investem no mundo. Existe uma contrapartida positiva: trata-se de investimento com boa produtividade - tanto que, em comparação com a metodologia anterior, o resultado dos últimos anos mostra que tivemos mais crescimento com menos investimentos.O peso relativo do setor serviços é muito maior: pela ótica da oferta, a participação dos serviços cresceu substancialmente, de 56,3% na estrutura antiga para 66,7%. Parte da revisão foi reflexo da inclusão de novos serviços de informação e da melhor apuração do segmento financeiro. Mas também houve importante expansão do peso relativo do comércio (de 7,1% para 10,6%), bem como melhora na qualidade da apuração do resultado da administração pública.Temos uma posição de endividamento bem mais confortável: a dívida líquida do setor público, como proporção do PIB, foi de 44,7% em fevereiro de 2007 (contra aproximadamente 50% pela sistemática antiga). Num cenário em que o crescimento econômico é maior e tende a ser menos volátil e a tendência das taxas de juros é de queda, a hipótese de uma convergência rápida para patamares de endividamento líquido do setor público em torno de 40% em 2010 ou antes se torna perfeitamente viável. E a obtenção do grau de investimento num período relativamente curto, que já era muito provável, se torna ainda mais.Nossos desafios, de forma geral, não mudaram. Se é bom saber que crescemos mais e suspeitar que nosso potencial é mais elevado, ainda é desconfortável observar nossa posição relativa, de taxas de expansão inferiores à média mundial. Se é (até surpreendentemente) bom saber que o investimento tem sido tão produtivo, permanece o desafio de ampliá-lo. Certamente o Brasil não precisa de taxas de Formação Bruta de Capital Fixo/PIB equivalentes às asiáticas, mas estar entre os países que menos investem no mundo coloca em risco a obtenção de novos ganhos de produtividade no futuro e deve, sem dúvida, nos incomodar.Por fim - sempre - o tamanho do Estado: com o aumento nominal do PIB, o peso relativo da carga tributária caiu. Mas, em termos comparados, permanecemos posicionados entre os países que apresentam maior transferência de recursos para o Estado, muito distantes da mediana de nossos pares emergentes.O PIB pela nova metodologia oferece uma visão mais clara dos resultados positivos que algumas mudanças ocorridas na economia brasileira durante os últimos anos trouxeram como conseqüência. Mudanças profundas, algumas delas difíceis (o próprio processo de abertura, em resumo), mas das quais resultaram ganhos de produtividade agora mais evidentes. Que sirvam de estímulo para uma maior mobilização por novas reformas no futuro.José Mauro Delella - Superintendente de Análises Econômicas/Área de Mercado de Capitais do Banco Itaú. Próximo artigo do autor em 15 de maio