Da coisas inevitáveis
Opinião - Das coisas inevitáveis Simone Cavalcanti A morte, como todos sabemos, é inevitável. Não tem jeito. Assim como, na conjuntura atual, a desvalorização do dólar. Note-se bem que é um processo de desvalorização da moeda norte-americana frente à de outros países do mundo, e não apenas ao real. Isso vem ocorrendo há alguns anos por causa do desequilíbrio das contas externas dos Estados Unidos. É claro que, por uma estrutura favorável brasileira - com o maior ingresso de recursos provenientes de exportações, de investimentos produtivos e financeiro -, o real acabou apreciando mais. No entanto, essa maior valorização da moeda nacional tem ocorrido contra o dólar. Vejamos o registrado no último ano: tomando por base as cotações de venda em abril de 2006 e neste mês, nota-se que, enquanto o euro e a libra esterlina passaram a custar mais em reais, o dólar seguiu o rumo contrário. Nesse período, a cotação do euro passou de R$ 2,61 para R$ 2,75 e a da libra, de R$ 3,79 para R$ 4,06. Já a moeda norte-americana ficou mais barata, recuando de R$ 2,11 para R$ 2,02. Diante do cenário econômico mundial e a força dos fundamentos da economia brasileira, o que esperar para a relação do dólar com o real se- não que ainda haja um gradual, porém continuado, processo de desvalorização pela frente? Assim como o fim da inflação trouxe à tona a necessidade de o Estado ajustar suas contas - o que, infelizmente, foi feito por aumento de impostos e não por corte de despesas -, o real apreciado expôs os problemas estruturais que afetam diretamente o setor produtivo brasileiro. Não adianta querer tapar o sol com a peneira: o problema da competitividade não está centrado no câmbio, mas tem suas raízes na alta carga tributária e nos custos trabalhistas, que só fazem crescer, e também no aprimoramento tecnológico da própria indústria. Tanto o governo sabe disso que o próprio ministro da Fazenda, Guido Mantega, já mudou o seu discurso, que agora está mais para o conformismo da desvalorização do dólar em relação ao real. Ao mesmo tempo anuncia medidas que mostram que está preocupado e quer ajudar. Uma das mais recentes é a que diz respeito à desoneração da folha de pagamento dos setores que se declaram mais prejudicados com a atual situação cambial, como calçados, têxteis e móveis. Além dessa redução tributária, estaria em estudo também a transferência do custo das contribuições, como a previdenciária, que pertencem à folha para o faturamento da própria empresa. O ministro do Trabalho, Carlos Lupi, por sua vez, defende a ampliação da medida para todos os setores da economia de acordo com o número de contratações formais a serem feitas. Para tanto será preciso abrir mão de arrecadação, o que torna o problema complexo, mas não insolúvel, caso agora opte-se pela redução de despesas. Assim, se a contínua apreciação do real frente ao dólar ao menos servir para que o governo melhore a questão fiscal e tributária, muito melhor. Simone Cavalcanti - Editora-adjunta de NacionalE-mail: scavalcanti@gazetamercantil.com.br