Previdência continua a gerar atritos
O governo Lula pretende ter, até o fim de agosto, pelo menos um anteprojeto de reforma previdenciária para propor ao Congresso Nacional. Esse é o prazo para conclusão do Fórum Nacional da Previdência Social (FNPS), instância de discussão e consulta formada com esta finalidade, com participação do governo, de representantes de trabalhadores e de empresários. Profundas divergências entre os atores envolvidos, no entanto, terão que ser superadas para construção da proposta, cujo objetivo é assegurar sustentabilidade de longo prazo ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Baseados em projeções de mudança do perfil demográfico brasileiro, empresários e autoridades governamentais vêem como inevitável um maior rigor nas regras de acesso aos benefícios, principalmente quanto à idade. Por outro lado, os representantes dos trabalhadores, para quem as regras de concessão já são suficientemente restritivas, dizem que os verdadeiros problemas estão na forma de financiamento do regime, a começar pela base de incidência das contribuições previdenciárias, hoje concentradas na folha salarial das empresas. O horizonte de sustentabilidade do RGPS sem qualquer alteração estrutural é relativamente curto. "Uns quatro ou cinco anos", estima Helmut Schwarzer, secretário de políticas de previdência social do Ministério da Previdência. Nesse intervalo, medidas meramente de gestão, que melhoram o combate à sonegação e aos benefícios fraudulentos, serão suficientes para evitar que o déficit entre receitas e despesas se torne insustentável a ponto de provocar interrupção do pagamento de aposentadorias e pensões. No seu conceito mais amplo, esse déficit, estimado em R$ 45,8 bilhões para 2007, seguirá controlado como proporção do Produto Interno Bruto, por alguns anos. A preocupação do governo é como manter a capacidade de pagamento do regime num horizonte mais longo, diante dos efeitos do envelhecimento da população. Ao mesmo tempo em que cresce a expectativa média de vida, o ritmo de nascimentos cai. Os idosos vivem cada vez mais, aumentando o período de recebimento de benefícios previdenciários. Paralelamente, a desaceleração do crescimento populacional reduz o ritmo de ingresso de pessoas no universo de contribuintes do RGPS. A tendência, portanto, é de que o grupo de pessoas que demanda despesas da Previdência Social cresça proporcionalmente mais do que aquele que a sustenta. O fenômeno já vem acontecendo. Segundo o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), existiam 4,8 contribuintes para cada beneficiário em 1980. Em 2000, o número já tinha caído para 2,8. Projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística indicam que a expectativa média de vida no Brasil, atualmente de 72,48 anos, aumentará mais de cinco anos num espaço de apenas duas décadas, alcançando 77,61 anos em 2027. Helmut Schwarzer entende que é dever da atual geração de brasileiros ajustar as regras de acesso aos benefícios às mudanças no perfil demográfico do Brasil. E isso inclui, na sua opinião, retardar o momento de aposentadoria das pessoas. Questões como diferença de critério por sexo também precisam ser debatidas, na sua avaliação. Quanto mais cedo for feita a reforma, mais suave será a transição, evitando traumas, alerta o secretário. O governo defende a preservação de direitos adquiridos. Isso torna ainda mais necessário o caráter gradativo da reforma. As novas regras só afetariam integralmente quem entrasse depois da mudança no mercado de trabalho. Os que já estão em idade produtiva e contributiva só seriam afetados em relação ao período que falta para se aposentar. E nada mudaria para os já aposentados.