Emenda 3 – Procurador defende a Fiscalização do Trabalho

10 Mai 2007
O Procurador do Trabalho Sílvio Beltramelli publicou interessante artigo defendendo a Fiscalização do Trabalho contra a Emenda 3 e rebatendo argumentos que têm sido difundidos em defesa dela, que não correspondem à realidade do mercado de trabalho.Leia o artigo: 8-5-2007 - Correio Popular Opinião - O que precisa ser dito Sílvio Beltramelli Recentemente, tomou grande proporção a discussão do projeto de lei que criou a Super Receita, mais especificamente quanto à seguinte emenda: ´no exercício das atribuições da autoridade fiscal de que trata esta Lei, a desconsideração da pessoa, ato ou negócio jurídico que implique reconhecimento de relação de trabalho, com ou sem vínculo empregatício, deverá sempre ser precedida de decisão judicial´. Apesar do Presidente da República haver vetado tal dispositivo, ainda se fala em possível derrubada do veto presidencial pelo Congresso Nacional. Nota-se uma forte adesão à emenda, vez que os argumentos apresentados pelos seus defensores gozam de eloqüência bastante para cativar a opinião pública.Muitos meios de comunicação afirmam que a proposta só faz preservar a competência já imputada pela Constituição à Justiça do Trabalho para o reconhecimento da relação de emprego. Bradam que a emenda 3 ´impede que a fiscalização do trabalho haja de forma arbitrária ao identificar relação de emprego entre prestadores e tomadores de serviço, com aplicação de multa´ e que ´incentiva a criação de mais empregos´. Nada mais falacioso.É premissa básica dentro do Direito do Trabalho que o contrato de emprego é caracterizado a partir do Plano Real e não do nome que porventura as partes dão ao contrato. Nos termos da lei, sempre será empregado aquele que trabalhe, habitual e pessoalmente, com subordinação, a benefício econômico de outrem e recebendo remuneração. Verificadas estas condições na rotina da relação mantida, estar-se-á diante de típico vínculo empregatício, não importando que o trabalhador tenha firmado contrato denominado de prestação de serviços.A experiência da atividade da Justiça do Trabalho, do Ministério Público do Trabalho e da Fiscalização do Trabalho evidencia que a constituição de pessoa jurídica pelo trabalhador vem sendo o principal mecanismo para tentar simular outra relação que não a de emprego, afastando do vínculo as disposições legais trabalhistas, que conferem direitos básicos ao trabalhador, tais como férias, 13º salário, FGTS, entre inúmeras outras.Ora, não é difícil reparar que a atuação fiscal é uma atividade de constatação da regularidade da situação averiguada. Ao constatar que, na prática, há verdadeira relação de emprego ocultada por contrato civil de prestação de serviços, o Auditor Fiscal age como promotor da legalidade. Ele não sentencia, apenas constata. Se para tanto a fiscalização passar a depender de prévia autorização judicial, os empregadores não se furtarão a sempre indicar que mantêm formalmente contratos com pessoas jurídicas, instaurando controvérsia a ser levada ao Judiciário e impedindo o imediato ajustamento da realidade desvirtuada, sem falar no abarrotamento ainda maior dos tribunais e do prejuízo às ações do Ministério Público do Trabalho, sobremaneira calcadas nas constatações fiscais.É o que passará a ocorrer nos casos de trabalho em condições análogas à de escravo, ainda flagrado, por todo o Brasil, a partir das ações do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, chefiado por auditores fiscais. E nem há que se falar em medida contra a arbitrariedade da atuação fiscal, porque a lei já assegura que todo auto de infração lavrado comporta recurso em pelo menos duas instâncias administrativas, as quais ainda podem ser superadas por decisões judiciais. É imperioso reconhecer, em tempo de desemprego em massa, que o trabalhador, enquanto sujeito à dispensa imotivada, raramente recorrerá à ação judicial para buscar direitos, apresentando-se a fiscalização do trabalho e o Ministério Público como aptos a, por impulso próprio, promover a correção da prática ilegal, isentando o trabalhador da retaliação patronal.Portanto, a aprovação da emenda 3 consubstancia reprovável retrocesso na busca da proteção ao trabalho em condições dignas. Incentivar a criação de pessoas jurídicas como forma de manter o empregado alijado dos direitos garantidos constitucionalmente é promover a precarização do emprego. Não se pode crer razoável que o importante é ter trabalho, seja em que condição for, substituindo-se o direito do trabalho pelo direito ao trabalho. Sob este ponto de vista, a emenda 3, longe de incentivar a criação de mais empregos, inspira a dissimulação dos vínculos empregatícios e a informalidade das relações de trabalho, a serem combatidas a partir da missão do Auditor Fiscal do Trabalho. Retirar esta possibilidade de fiscalizar é, em suma, institucionalizar a fraude. Silvio Beltramelli é procurador do Trabalho, lotado na 23ª Região, mestre em Direito pela Unimep e professor licenciado da Faculdade de Direito da PUC-Campinas