Drama dos calçados e a importação de empregos da China

30 Mai 2007
Calçados Reichert, de Campo Bom, desativará 20 das suas unidades e desempregará quatro mil pessoas, por causa do câmbio. Segue o caminho de outras 65 indústrias de calçados do Vale do Sinos, com a despedida de 22 mil trabalhadores. Ora, isso é uma tragédia socioeconômica, mais social do que econômica, se é que se pode separar causa e efeito. Tão-somente nos quatro primeiros meses de 2007, o Brasil aumentou em 120% as importações de máquinas e equipamentos da China, em comparação com o mesmo período de 2006, ou US$ 330,07 milhões. Se antes eram apenas brinquedos, camisas e outros badulaques, miçangas, hoje aparelhos eletrônicos despontam, com o Made in China figurando em muitos produtos que utilizamos, segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Ipea. Enquanto o Brasil tem dificuldade em exportar mercadorias com maior valor agregado, mantendo-se ainda nas commodities, 30% do total embarcado, a China avançou célere neste quesito. Dos 30 principais produtos enviados pelos chineses ao Brasil, 27 estão entre máquinas e equipamentos. Da parte do Brasil, em 2006 apenas três produtos representaram 64% das nossas exportações para aquele país, grãos de soja, minério de ferro e óleo bruto de petróleo. Nem em óleo de soja conseguimos abrir espaço no dragão chinês, pois em 2005 ele representou somente 9%, enquanto o grão de soja bruto chegou a 91% das vendas do complexo soja para a China. A economista Marta Reis Castilho, da Universidade Federal Fluminense, fez estudo comparativo sobre a troca de empregos entre a indústria chinesa e a brasileira.Assim é que as vendas brasileiras para os chineses em 2005 criaram 560 mil empregos aqui. As importações da China ameaçaram 237 mil postos de trabalho, com um saldo ainda positivo para o Brasil de 322 mil empregos. Em 2005 tivemos superávit de US$ 1,48 bilhão, valor que caiu em 2006 para US$ 410 milhões. Para 2007, a previsão é de déficit com a China. Fernando Pimentel, diretor de entidade que reúne indústrias têxteis, calcula que foram fechados 100 mil postos de trabalho no País por conta das importações vindas da China. Em 2007 poderão acabar outros 200 mil empregos. A indústria têxtil brasileira é ainda a sétima maior do mundo, empregando 1,6 milhão de pessoas. Fernando Pimentel esclarece que os empresários nacionais não temem os chineses, mas sim o real sobrevalorizado, a carga tributária, que é o dobro da chinesa, a falta de acordos do Brasil com os EUA e a União Européia e a flagrante ilegalidade em boa parte das importações. Apesar disso, a 8ª Texfair do Brasil começou em Blumenau, com 400 marcas em 200 estandes, com os lançamentos para a primavera/verão 2007/2008, mais 25% de expositores e de espaço, 25 mil metros quadrados. Também sofrem os calçadistas, confirma Heitor Klein, diretor da Abicalçados, que alertou que as exportações caíram 5% o ano passado. O Brasil enfrenta mais a concorrência da China em outros mercados do que aqui dentro. O executivo confirma que a desvalorização cambial afetou a Reichert. Em 1993, o Brasil tinha 13% do mercado dos Estados Unidos, hoje não passa de 5%. Reconhecer a China como economia de mercado, o que o Brasil fez sem pedir qualquer compensação, mostra-se hoje como um erro. Alan Greenspan, ex-presidente do Federal Reserve, alertou que uma gigantesca bolha está sendo criada na Ásia e que a China não conseguirá se manter com crescimento de 10% a 11% ao ano. Vai explodir. O dragão é mortal em termos de comércio, temos mesmo de nos proteger.