Veja o parecer jurídico sobre o Regimento Interno da RFB
PARECER Nº 052/2007/JURÍDICO/DEN
Brasília, 30 de maio de 2007.
ASSUNTO: Regimento Interno da Secretaria da Receita Federal do Brasil –
Portaria MF 95, de 30 de abril de 2007 - Usurpação das atribuições
dos Auditores Fiscais da Secretaria da Receita Federal do Brasil –
Art. 37, inciso V, da Constituição Federal – Lei n. 10.593/2002 –
Lei n. 11.457/2007 – Código Tributário Nacional.
INTERESSADO: Diretoria Executiva Nacional
HISTÓRICO
1. Com advento da Lei n. 11.457, de 16 março de 2007, a Secretaria da Receita
Federal - SRF passou a denominar-se a Secretaria da Receita Federal do Brasil - SRFB,
acrescendo às suas competências planejar, executar, acompanhar e avaliar as atividades relativas
a tributação, fiscalização, arrecadação, cobrança e recolhimento das contribuições sociais
previstas nas alíneas a, b e c do parágrafo único do artigo 11 da Lei n. 8.212, de 24 de julho de
1991, e das contribuições instituídas a título de substituição.
2. A Lei n. 11.457/2007 cria, ainda, a Carreira Auditoria da Receita Federal do
Brasil, composta dos cargos de nível superior de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil -
AFRFB e de Analista-Tributário da Receita Federal do Brasil, extinguindo as Carreiras
Auditoria da Receita Federal e Auditoria-Fiscal da Previdência Social e, promovendo,
consequentemente, a alteração da Lei nº 10.593, de 6/12/2002, inclusive e, especialmente, no
que tange às atribuições dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil.
3. Ressalte-se que o Chefe do Poder Executivo, inicialmente, editou a Medida
Provisória n. 258, em 21 de julho de 2005, que tinha por finalidade a alteração da
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Administração Tributária Federal, no sentido de alterar a Secretaria da Receita Federal para
Secretaria da Receita Federal do Brasil, como ocorrido com a Lei nº 11.457/2007.
4. Em 18 de novembro de 2005 a Medida Provisória n. 258/2005 perdeu a
eficácia e por iniciativa do Poder Executivo, ainda no mês de novembro de 2005, foi
apresentado projeto de lei (PL n. 6.272/2005) com a mesma finalidade.
5. O Projeto de Lei n. 6272/2005 foi transformado na Lei n. 11.457, de 16 de
março de 2007, publicada em 19 de março de 2007. Portanto, verifica-se que o Governo já
tinha intenção em alterar o órgão Secretaria da Receita Federal desde o mês de julho de 2005,
quando editada a MP 258.
6. Como conseqüência da nova configuração da Administração Tributária Federal
ocorreu a mutação da Secretaria da Receita Federal para Secretaria da Receita Federal do Brasil.
Em observância ao § 3º, artigo 6º, da Lei nº 10.593/02, que dispõe que o Poder Executivo
regulamentará as atribuições dos cargos de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil e de
Analista-Tributário da Receita Federal do Brasil, o então Ministro de Estado da Fazenda editou
a Portaria nº 95/2005, de 30 de abril de 2007, com fundamento no Decreto n. 6.102, de 30 de
abril de 2007, aprovando o Regimento Interno da Secretaria da Receita Federal, onde o
Departamento Jurídico passa a analisá-lo.
CONSIDERAÇÕES
7. A Portaria em questão, ao definir as competências dos Superintendentes,
Delegados e Inspetores da Secretaria da Receita Federal do Brasil transferiu àqueles, em
dispositivos específicos, por meio de uma fictícia “avocação”, atribuições privativas dos
AFRFB, definidas no inciso I, artigo 6º, da Lei 10.593, de 6/12/2002, com as alterações
promovidas pela Lei nº 11.457/2007.
8. A primeira questão de direito, portanto, diz respeito à possibilidade de
“avocação” ou “delegação” de competências privativas dos AFRFB por meio de
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Regimento Interno, exteriorizado por Portaria (1) e, neste âmbito, da possibilidade dos
ocupantes de funções de confiança exercerem as atribuições privativas dos AFRFB.
9. A Constituição Federal em seu artigo 37, inciso V, determina que aos
servidores investidos em funções de confiança cabem apenas as atribuições de direção, chefia e
assessoramento, conforme a redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998.
V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo
efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições
e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção,
chefia e assessoramento ; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de
1998) (destaquei)
10. As funções de Delegado, Inspetores e Superintendentes são funções de
confiança, conforme denominações do Anexo XIII do Regimento Interno da SRFB, que trata,
exclusivamente, dos Cargos/Funções dos dirigentes das Superintendências, Delegacias, Alfândegas,
inspetorias e Agências. Suas atribuições, por determinação Constitucional, se referem tão-somente
à direção, chefia e assessoramento.
11. Note-se que, embora os servidores Delegados, Inspetores e Superintendentes,
investidos nos cargos comissionados e nas funções de confiança, sejam ocupantes de cargos
efetivos, tal condição é apenas requisito para a investidura naquelas funções, mas as atribuições
serão apenas de chefia, assessoramento ou direção.
12. Logo, o exercício das atribuições inerentes às funções de confiança não diz
respeito às atividades-fim da Secretaria da Receita Federal do Brasil, especificadas no inciso I,
artigo 6º, da Lei nº 10.593/02, que correspondem às atribuições privativas dos AFRFB.
13. Conclui-se, portanto, que a Constituição Federal limitou o cenário das
atividades dos ocupantes de cargos em comissão apenas para desempenhar as atribuições de
direção, chefia e assessoramento. O Regimento Interno da SRFB, aparentemente, evidencia
(1) Gasparini, Diógenes. Direito Administrativo, 9ª ed. 2004, Saraiva: São Paulo. Pág. 87,
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nos dispositivos genéricos, a exemplo do artigo 242, que as atribuições dos Superintendentes e
Delegados se referem especificamente ao gerenciamento e modernização da administração
tributária; contudo, as atribuições descritas nos incisos do artigo citado corroboram a
ilegalidade praticada pelo administrador público.
Art. 242. Aos Delegados da Receita Federal do Brasil das DRF, DRP, Deinf, Defis e Deain
incumbe, no âmbito da respectiva jurisdição, as atividades relacionadas à gerência e à
modernização da administração tributária e, especificamente , autorizar ou
determinar a execução de perícia e de procedimentos fiscais mediante a expedição de Mandado de
Procedimento Fiscal, inclusive para reexame ou abertura de novos procedimentos fiscais em
períodos anteriormente auditados. (destaquei)
14. Ou seja, as atribuições previstas no inciso I, artigo 6º, da Lei 10.593/02 são
privativas dos ocupantes do cargo de AFRFB, considerados pela legislação e pela
jurisprudência como autoridades administrativas em matéria de Administração Tributária,
diferentemente dos servidores comissionados que devem desempenhar, tão-somente,
atribuições relacionadas à chefia, direção e assessoramento, tendo em vista a limitação prevista
no artigo 37, inciso V, da Constituição Federal.
15. Essas atividades (chefia, direção e assessoramento) dizem respeito ao
gerenciamento e modernização da administração tributária, em caráter exclusivamente
administrativo, e não técnico, como a fiscalização, lançamento, arrecadação e julgamento de
processo administrativo-fiscal, atividades próprias das autoridades administrativas tributárias.
16. Na terminologia administrativa, seja pública ou particular a idéia de direção está conjugada
com a de administração, por que esta é conseqüente dos atributos que fazem o conteúdo da primeira: dirigir e
administrar, assim, se mostram equivalentes (De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico, 25ª ed.,
Forense: Rio de Janeiro, 2004).
17. Já a gerência, indica-se o ofício ou a função de gerente, sendo, assim, equivalente a gestão,
administração ou direção de negócios. Quanto ao gerente entende-se a pessoa a quem se competem às funções
ou as atribuições de uma gerência. (...) Gerente, em regra, exprime esse sentido de administrador, e gerência,
administração. (Op. cit., p. 657)
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18. Note-se que, o vocábulo especificamente, contido no texto do artigo 242 do
Regimento Interno ora tratado, é o substantivo geralmente empregado para designar o ato de distinguir as
espécies das coisas ou subdividi-las do gênero, que no contexto do artigo se dá quanto às atividades
relacionadas à gerência e à modernização da administração tributária, isto é, a demonstração,
individualização das coisas por suas espécies. (Op. cit., p. 547), ou seja, na “espécie” gerência e
modernização da administração tributária.
19. Acrescenta, neste sentido, Diógenes Gasparini, que os cargos de provimento em
comissão são próprios para a direção, comando ou chefia de certos órgãos, para os quais se necessita de um
agente que sobre ser de confiança da autoridade nomeante se disponha a seguir sua orientação, ajudando-a a
promover a direção superior da Administração. (2)
20. Não é por outra razão, que o doutrinador manifesta o entendimento de que é
necessária a limitação do número de cargos comissionados ou de funções de confiança,
devendo ser preservado o cargo de provimento efetivo, via concurso público, para o
desempenho das atividades-fim dos órgãos públicos, ou seja, a utilização de cargos em
comissão para o exercício de atividade-fim/privativa gera, conseqüentemente, desvio de
finalidade na criação do cargo comissionado, que deve, por essência e exclusividade, atender
somente as atribuições de assessoramento, chefia e direção.
21. Além de configurar o desvirtuamento do dispositivo constitucional que trata
das atribuições dos cargos comissionados e das funções de confiança, o desempenho das
atribuições privativas de AFRFB por servidores comissionados repercute em gastos
desnecessários, onerando o Erário, na medida em que é acrescido substantivamente o
número de servidores comissionados que recebem gratificações para acumular,
ilegalmente, as atribuições de chefia, direção e assessoramento com as atribuições
privativas dos AFRFB; portanto, há notória violação ao princípio da legalidade, da probidade
administrativa, e, indiretamente, da eficiência, pois os atos da Administração Pública estão
(2) Gasparini, Diógenes. Direito Administrativo, 9ª ed. 2004, Saraiva: São Paulo. Pág. 256 e 257
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concentrados nos servidores comissionados, provocando o retardamento de seu
funcionamento.
22. Ademais, o Código Tributário Nacional, recepcionado pela Constituição
Federal de 1988 como Lei Complementar, define a competência das autoridades
administrativas em seus artigos(3) 142 e 149, que tratam do lançamento, e nos artigos (4) 194,
196, 197 e 200, relativos aos procedimentos de fiscalização; por conseguinte, a Lei n.
10.593/02 quando prevê as atribuições privativas dos AFRFB ratifica o Código Tributário
Nacional, identificando-os também como autoridades administrativas tributárias ou
fazendárias.
23. Ainda, depreende-se do arcabouço da legislação tributária, em especial os
regulamentos aduaneiro, do imposto de renda e sobre produtos industrializados, que as
atividades da autoridade administrativa tributária ou fazendária, dizem respeito àquelas
desempenhadas, ordinariamente, pelo AFRFB, na fiscalização, lançamento, arrecadação,
tributação e julgamento.
(3) Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim
entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente,
determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a
aplicação da penalidade cabível.
Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.
(...)
Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos:
(...)
(4) Art. 194. A legislação tributária, observado o disposto nesta Lei, regulará, em caráter geral, ou especificamente em função
da natureza do tributo de que se tratar, a competência e os poderes das autoridades administrativas em matéria de fiscalização
da sua aplicação.
(...)
Art. 196. A autoridade administrativa que proceder ou presidir a quaisquer diligências de fiscalização lavrará os termos
necessários para que se documente o início do procedimento, na forma da legislação aplicável, que fixará prazo máximo para a
conclusão daquelas.
Parágrafo único. Os termos a que se refere este artigo serão lavrados, sempre que possível, em um dos livros fiscais exibidos;
quando lavrados em separado deles se entregará, à pessoa sujeita à fiscalização, cópia autenticada pela autoridade a que se
refere este artigo.
(...)
Art. 197. Mediante intimação escrita, são obrigados a prestar à autoridade administrativa todas as informações de que
disponham com relação aos bens, negócios ou atividades de terceiros: (...)
(...)
Art. 200. As autoridades administrativas federais poderão requisitar o auxílio da força pública federal, estadual ou municipal, e
reciprocamente, quando vítimas de embaraço ou desacato no exercício de suas funções, ou quando necessário à efetivação dê
medida prevista na legislação tributária, ainda que não se configure fato definido em lei como crime ou contravenção.
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24. Nesse contexto, a Lei 10.593/02 definiu como atribuição privativa do AFRFB a
atividade de lançamento do crédito tributário e contribuições, referindo-se, obviamente, aquele
que esteja no pleno exercício de suas atribuições, e não somente no exercício inerente e restrito
das atividades relacionadas às funções de confiança, conforme disciplinou o artigo 37, inciso V,
da Constituição Federal.
25. Portanto, o Secretário da Receita Federal do Brasil, ao retirar a autonomia
administrativa-tributária do Auditor-Fiscal, acaba por violar o Estado Democrático de Direito,
vindo a Secretaria da Receita Federal do Brasil desmoralizar a sua própria base, Auditores-
Fiscais, passando, indiretamente, uma imagem desacreditada do órgão, até porque, são os
Auditores-Fiscais responsáveis pela construção da credibilidade Secretaria da Receita Federal
do Brasil.
26. Sobre o assunto, o Auditor Fiscal da Receita Federal tem autoridade, nas suas
atribuições, para proceder na forma do art. 194 e seguintes do CTN (TRF1 - ACR 2000.37.01.000175-
9/MA, DJ 18/12/2006 p.181), in verbis:
“PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA
(LEI Nº 8.137/90: ART 1º, INCISOS I e V, PARÁGRAFO ÚNICO, C/C ART 11).
AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. SUSPENSÃO DO
PROCESSO E DESCLASSIFICAÇÃO DO TIPO PENAL. IMPOSSIBILDADE.
DOLO. EXISTÊNCIA. AUDITOR FISCAL. AUTORIDADE FAZENDÁRIA.
ATENUANTES. INAPLICABILIDADE.
1. O conjunto probatório constante dos autos comprova claramente a prática do delito imputado ao réu.
2. A opção da pessoa jurídica, gerenciada pelo acusado, pelo REFIS foi indeferida pelo Comitê Gestor.
De conseqüência, não faz jus à suspensão do processo, prevista no art. 9º da Lei nº 10.648/03.
3. A conduta do réu está caracterizada nas figuras típicas previstas no art. 1º, incisos I e V, parágrafo
único, c/c art. 11 da Lei nº 8.137/90, e não no art. 299 do CP, como defende o réu.
4. Não basta o interesse do réu em pagar débito fiscal para o afastamento do dolo específico. É preciso
que, efetivamente e nos termos da lei, esse pagamento seja efetuado. In casu , isso não ocorreu.
5. O Auditor Fiscal da Receita Federal tem autoridade, nas suas atribuições, para
proceder na forma do art. 194 e seguintes do CTN.
6. Inaplicáveis as atenuantes previstas no art. 65, II e III, “b”, do CP na dosimetria da pena do réu.
7. Apelação improvida.”
27. Poderia buscar-se em contra-argumentação, que por meio do Regimento
Interno houve “avocação” das atribuições privativas dos AFRFB pelos Delegados e
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Superintendentes, com fundamento no poder hierárquico do administrador público;
porém, tal assertiva não tem respaldo legal.
28. É correto afirmar que a delegação e a avocação administrativas consistem em
atributos do poder hierárquico da Administração Pública, e são correlacionados diretamente
com o poder de autotutela administrativa, consubstanciada na Súmula n. 473 do Supremo
Tribunal Federal, sendo a delegação o poder de conferir a outrem atribuições originárias, e a
avocação a substituição da competência inferior pela superior, desde que haja motivos
relevantes para tanto.
29. Contudo, os poderes decorrentes da hierarquia administrativa, entretanto, não
são absolutos, pois esbarram principalmente na lei, na impossibilidade de se delegar atos
políticos (voto, veto, sancionar, etc.), bem como atos de poderes diversos (Judiciário,
Legislativo, etc.), além do fato de que outra restrição é que os atos personalizados
(designados por lei a um só agente/órgão executor) não podem ser delegáveis, ou seja,
os atos privativos não podem ser delegáveis ou avocados.
30. Acerca da legalidade – existência de previsão legal expressa – para delegação e
avocação, veja-se o que dispõe o art. 11 da Lei nº 9.784/99, verbis:
Art. 11. A competência é irrenunciável e se exerce pelos órgãos administrativos a que foi
atribuída como própria, salvo os casos de delegação e avocação legalmente
admitidos.(destaquei)
31. Quanto aos limites gerais de delegação, veja-se o disposto na mesma norma:
Art. 13. Não podem ser objeto de delegação:
I - a edição de atos de caráter normativo;
II - a decisão de recursos administrativos;
III - as matérias de competência exclusiva do órgão ou autoridade.
Art. 14
(...)
§ 1o O ato de delegação especificará as matérias e poderes transferidos, os limites da atuação do
delegado, a duração e os objetivos da delegação e o recurso cabível, podendo conter ressalva de
exercício da atribuição delegada.
(...)
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§ 3o As decisões adotadas por delegação devem mencionar explicitamente esta qualidade e
considerar-se-ão editadas pelo delegado.
(...)
Art. 15. Será permitida, em caráter excepcional e por motivos relevantes devidamente justificados,
a avocação temporária de competência atribuída a órgão hierarquicamente inferior. (destaquei)
32. Por privativo, entende-se o que é próprio da pessoa, com exclusão das demais. E, assim, o
que é exclusivo dela, somente por ela pode ser feito ou praticado, pois que somente ela tem autoridade ou
competência para o fazer. Em relação aos cargos ou funções, o que é privativo deles,
constitui suas prerrogativas . (De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico, 25 ed.; Forense: Rio
de Janeiro, 2004. p. 1097) (destaquei)
33. Na terminologia do Direito Público, a competência administrativa indica a soma de poderes
que as leis outorgam às autoridades administrativas, para que possam administrar e gerir os negócios públicos.
A competência administrativa atua num plano de hierarquia, segundo as regras legalmente instituídas, pelo
qual são traçados os limites jurisdicionais de cada autoridade, seja em relação à matéria, seja, mesmo, em
relação ao território. Pode ser especial ou privativa, como pode ser geral. Assim, “mutatis mutandis”, é a
competência que se diz exclusiva do tribunal do juiz, não sendo prorrogável. È a mesma competência originária.
(Op cit. p. 319 e 320)
34. Não é possível afirmar também que o Decreto nº 6.102, de 30 de abril de 2007,
editado pelo Presidente da República para aprovar a estrutura regimental e o quadro
demonstrativo dos cargos em Comissão e das Funções Gratificadas do Ministério da Fazenda
seja o regulamento a que se refere o § 3º, artigo 6º, da Lei nº 10.593/02.
35. Em leitura mais atenta, percebe-se que o escopo do decreto é a organização
interna do Ministério da Fazenda, distribuindo entre seus órgãos, onde se inclui a Secretaria da
Receita Federal do Brasil, as atribuições conferidas ao Ministério. Já o regulamento a que se
refere o § 3º, artigo 6º, da Lei nº 10.593/02, trata especificamente das atribuições dos
Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil, que se encontram definidas em lei específica, e
até o momento, regulamentadas por outro decreto, também específico, Decreto n. 3.611/00,
de 27 de setembro de 2000.
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36. O fato do artigo 5º do Decreto nº 6.102/07 dispor que os Regimentos Internos
dos órgãos do Ministério da Fazenda serão aprovados pelo Ministro de Estado, não delegou a
este o poder regulamentar do artigo 84, inciso IV, da Constituição Federal, no que tange ao
tema atribuições dos AFRFB, constante no § 3º, artigo 6º, da Lei nº 10.593/02. A uma, porque
lei federal não pode ser regulamentada por ato administrativo exteriorizado em portaria; a
duas, porque o Regimento Interno não é o caderno normativo apto a comportar tal matéria,
pois é apenas um código interno normatizador das condutas e procedimentos daquele órgão
específico; e a três, porque o objeto do Decreto nº 6.102/07 está limitado e definido e,
somente por Decreto ou Lei pode-se instituir ou regulamentar as atribuições e competências
do servidor público, que exerce munus publico, representando o Estado, vez que tal matéria é de
ordem pública, cogente e extrapola os limites das normativas internas do órgão no qual está
lotado. Regimento Interno não tem força de lei.
37. Verifica-se, pois, que é perfeitamente possível a delegação e a avocação de atos
administrativos desde que observados os limites gerais e específicos contidos na lei, além das
impossibilidades doutrinárias, dentre as quais a impossibilidade de delegação e avocação
de atos privativos.
38. Sobre o assunto, Hely Lopes Meirelles esclarece com primor que Avocar é
chamar a si funções originariamente atribuídas a um subordinado. Nada impede tal prática, que, porém, só
deve ser adotada pelo superior hierárquico quando houver motivos relevantes para tal
substituição, isto porque a avocação de um ato sempre desprestigia o inferior e, não
raro, desorganiza o normal funcionamento do serviço. Pela avocação substitui-se a competência
do inferior pela do superior hierárquico, com todas as consequências dessa substituição, notadamente a deslocação
do juízo ou da instância para ajustá-lo ao da autoridade avocante em caso de demanda. Assinala-se, também,
que a avocação desonera o inferior de toda responsabilidade pelo ato avocado pelo superior. Não pode ser
avocada atribuição que a lei expressamente confere a determinado órgão ou agente,
como, p.ex., de um ato por autoridade superior diversa da que deveria praticá-lo
originariamente por determinação legal. (5)
(5) Direito Administrativo Brasileiro. 27ª ed, 1990. Malheiros: SãoPaulo. P. 119
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39. Portanto, não é legal a delegação ou avocação se há vedação expressa ou se a
atribuição é de competência privativa ou exclusiva a determinados agentes públicos.
40. O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que a delegação
de competência deve ser vinculada à lei que a institui (RMS 9584/RO nº 1998/0021117-9,
Rel. Ministro Fernando Gonçalves, Sexta Turma, DJ 19.06.2000 p. 211) (6), isto porque os §§ 1º
e 3º do artigo 6º da Lei 10.593/02 informam que as atribuições gerais dos AFRFB, previstas
no inciso II, podem ser reconhecidas como de caráter privativo, mas o contrário é vedado,
não cabendo interpretação extensiva em razão do princípio da legalidade restrita ao
qual se submete a Administração Pública Federal.
§ 1o O Poder Executivo poderá cometer o exercício de atividades abrangidas pelo inciso II do caput
deste artigo em caráter privativo ao Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil.
§ 2o Incumbe ao Analista-Tributário da Receita Federal do Brasil, resguardadas as atribuições
privativas referidas no inciso I do caput e no § 1o deste artigo:
(...)
§ 3o Observado o disposto neste artigo, o Poder Executivo regulamentará as atribuições dos
cargos de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil e Analista-Tributário da Receita Federal
do Brasil.
41. No mesmo sentido, o § 3º informa que, o Poder Executivo regulamentará as
atribuições dos cargos de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil e Analista-Tributário da Receita Federal
do Brasil, desde que, observado o disposto no artigo, e não somente no “caput” (7), ou seja, há que ser
(6) ProcessoRMS 9584/RO; RECURSO ORDINARIO EM MANDADO DE SEGURANÇA 1998/0021117-9; Relator(a)
Ministro FERNANDO GONÇALVES; Órgão Julgador T6 - SEXTA TURMA; Data do Julgamento 06/06/2000; Data da
Publicação/Fonte DJ 19.06.2000 p. 211 Ementa: ADMINISTRATIVO. PROCESSO DISCIPLINAR. DELEGAÇÃO DE
COMPETÊNCIA. LEGISLAÇÃO ANTERIOR. POSSIBILIDADE NÃO PREVISTA NA LEI VIGENTE. 1. A Lei
Complementar Estadual nº 39/90 que autorizava a delegação de competência para a instalação de processo
administrativo não mais vigorava à época da instauração do procedimento, pelo contrário, estava em vigência a
Lei Complementar nº 68/92, que atribui, especificamente, a determinados agentes a competência para este mister
(art. 189). Está assim eivada de nulidade a portaria de instauração do procedimento, pois subscrita por agente que
atuava no exercício de função delegada. 2. Recurso ordinário provido.
(7) Artigos. Na terminologia jurídica possui também diversos sentidos: a) Designa divisão elementar e
fundamental das leis, na qual se encontra condensada uma disposição legal ou um princípio, que se constitui em
regra ou em norma a ser seguida em determinado caso, a qual, para faciilidade de citação, vem seguida de um
número, que é somente dele, em cada lei. As leis, regulamentos, regimentos, em que se formulem princípios e
regras para serem atendidos e cumpridos, são divididos em artigos, que vão numerados em ordem crescente, a
partir de um ou primeiro. Em tal hipótese os artigos podem ser fracionados em parágrafos e alíneas, que se
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observada, na atividade regulamentar do Poder Executivo, toda a sistemática adotada pelo
artigo da lei.
Continuando, Diógenes Gasparini (8) complementa anterior estudo de Hely Lopes Meirelles no
sentido de que pela ação de avocar ou avocação chamam-se para si funções atribuídas a outrem que lhe é
subordinado. Essa prática, apesar de ilegal, não deve ser abusiva, dados os inconvenientes que pode trazer, a
exemplo da deslocação, da diminuição e da extinção dos níveis ou graus dos recursos administrativos e o fato de
prestigiar o subordinado (RDA, 179/80: 163). A deslocação é a passagem da competência, digamos, do
Diretor para o Secretário. A diminuição é a supressão de um ou mais níveis recursais. Recorre-se do Diretor
para o Secretário e deste para o Prefeito. (...) A extinção póe fim aos níveis de recurso. (...) Diga-se, ainda, que
para o exercício da avocação há que existir motivo relevante de interesse público.
42. Note-se que, no inciso VI, artigo 238, do Regimento Interno da SRFB,
correspondente ao antigo inciso XXII do artigo 250 do Regimento da SRF, coube ao
Delegado decidir sobre a concessão de regimes aduaneiros especiais e pedidos de parcelamento, sobre restituição,
compensação, ressarcimento, reembolso, suspensão e redução de tributos. Ocorre que, o inciso I, artigo 6º,
da Lei 10.593/02, dispõe que proferir decisões ou delas participar, em processo administrativo-fiscal, bem
como em processos de consulta, restituição ou compensação de tributos e contribuições e de reconhecimento de
benefícios fiscais são atividades privativas do AFRFB.
43. Aqui, entende-se que a expressão “proferir decisões” se refere ao processo
administrativo-fiscal de juízo singular, enquanto a expressão “delas participar”, se refere ao
processo administrativo-fiscal de juízo coletivo, ou seja, nos colegiados das Turmas de
Julgamento e Conselhos de Contribuintes. E mais, nos processos que tratam de restituição,
compensação, e de benefícios fiscais (ressarcimentos, reembolso, suspensão e redução de
tributos), as atividades se encontram descritas, expressamente, na lei como privativas dos
AFRFB.
entendem a eles pertencentes. E por isso não podem ser citados sem alusão ao seu número: § do art. 26, ou alínea
a do art. 25. ( Silva, De Plácido e. Vocabulário Jurídico, 25ª e. 2004. Forense: Rio de janeiro, p.145)
(8) Gasparini, Diógenes. Direito Administrativo, 9ª ed. 2004, Saraiva: São Paulo. pag. 52-53
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44. De acordo com a doutrina anteriormente mencionada, identifica-se, no caso, a
nítida diminuição de competência com a supressão de uma instância recursal, vez que a
instância recursal que caberia ao Delegado foi suprimida com a usurpação da competência
originária do AFRFB para a prática dos atos privativos mencionados no inciso I, artigo 6º da
Lei 10.593/02, situação que aumenta a distância entre o contribuinte e a Administração
Tributária, dificultando sobremaneira a análise dos casos concretos, bem como a distância
entre os que ocupam a função de confiança e seus subordinados.
45. É necessário ressaltar, ainda, que o poder regulamentar tratado no § 3º do
artigo 6º da Lei n. 10.593/02 impõe que tal atividade se dê em compatibilidade com a lei e, no
caso, nos termos do artigo 84, inciso IV, da Constituição Federal, cabe ao Chefe do Poder
Executivo regulamentar a lei, tal como ocorreu com o Decreto nº 3.611 de 27, de setembro de
2000, então vigente, que estabelece as atribuições dos cargos da Carreira Auditoria da Receita
Federal e determina, no § 1º do artigo 1º, que o Secretário da Receita Federal poderá dispor
sobre o detalhamento das atribuições dos cargos de que trata o caput do artigo. O
detalhamento, obviamente, não pode acrescer ou diminuir o que já se encontra na lei.
46. O poder regulamentar é a prerrogativa da Administração Pública para editar
atos gerais a fim de complementar a lei e permitir a sua efetiva aplicação; a complementação
não pressupõe alteração da norma, e se assim o fizer o administrador estará cometendo abuso
do poder regulamentar, invadindo a competência do Poder Legislativo, podendo para tanto, o
Congresso Nacional sustar atos normativos que extrapolem os limites do poder regulamentar.
47. O Regimento Interno da Secretaria da Receita Federal do Brasil é um exemplo
típico de ato regulamentar abusivo, pois confere aos ocupantes de cargo em comissão
atribuições privativas de AFRFB. A natureza privativa das atribuições dos AFRFB é
determinada por previsão legal. O poder regulamentar tem natureza derivada, somente é
exercido à luz de lei preexistente, ato de natureza originária, emanado diretamente da
Constituição. Mesmo porque, sob o aspecto formal, na hierarquia dos atos normativos não
cabe à Portaria regulamentar disposições de lei ordinária e muito menos limitar competência
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atribuída pelo Código Tributário Nacional, que possui natureza e eficácia de Lei
Complementar.
48. Poderia ainda o administrador público sustentar que o Regimento Interno ao
transferir atribuições típicas da atividade de AFRFB aos Delegados, Inspetores e
Superintendentes estariam controlando um suposto excesso de autonomia do agente público;
contudo, tal justificativa não encontra qualquer respaldo, amparado por um mínimo de
razoabilidade. Isto porque, não cabe ao intérprete restringir onde a lei não o fez, mormente,
inserindo atribuições estranhas às atividades de chefia, direção e assessoramento, em evidente
desvio de finalidade do cargo comissionado, vez que neste não há previsão legal para o
exercício de outras atividades senão aquelas.
49. Assim, o artifício de legislar via Portaria, no âmbito de um Regimento Interno,
com a finalidade de exercer controle sobre as atividades do AFRFB é ilegal, senão
desnecessário, ex vi, o exercício do controle hierárquico a que se submetem os Auditores-
Fiscais. O controle hierárquico é o que resulta automaticamente do escalonamento vertical dos órgãos do
Executivo, em que os inferiores estão submetidos aos superiores. Daí decorre que os órgãos de cúpula têm sempre
o controle pleno dos subalternos, independentemente de norma que o estabeleça. O controle hierárquico pressupõe
as faculdades de supervisão, coordenação, orientação, fiscalização, aprovação, revisão e avocação das atividades
controladas, (9) salvo, obviamente, aquelas que não podem ser avocadas, em razão de sua
privaticidade, como já exposto.
50. A necessidade de isenção política e de preservação da moralidade e da
impessoalidade no desempenho das atividades-fim do órgão é outro fator que deve ser
observado no Regimento Interno da SRFB, razão pela qual facilmente se constata que essas
atividades não podem ser desempenhadas por servidores comissionados, diante da
imprescindibilidade dos requisitos elencados.
51. O “chefe” (Delegado, Inspetor ou Superintendente), nesta condição, não goza
de estabilidade na função, pois esta é de confiança e demissível “ad nutum”, situação que não
(9) Meirelles, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27ª ed, 1990. Malheiros: SãoPaulo. Pág. 633
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deve ocorrer com a autoridade administrativa a que se refere o Código Tributário Nacional e
demais normas tributárias, pois as atividades cujo exercício é privativo do Auditor-Fiscal não
podem ter caráter político e não podem estar condicionadas à instabilidade da função de
confiança.
52. Vale destacar que, durante o Brasil Império, a regra era que o desempenho das
funções públicas se desse por meio de delegação do imperador, ou seja, o exercício de cargos
públicos ocorria somente sob a modalidade “de confiança”, sendo lícito ao imperador admitir
ou exonerar funcionários públicos quando julgasse conveniente. Isso porque a vontade do
Imperador, rotineiramente, confundia-se com a vontade do Estado e com o interesse público.
53. No regime republicano, decaída a presunção de infalibilidade do imperador,
vislumbrou-se a necessidade de resguardar os funcionários públicos quanto aos eventuais
excessos na gestão da Administração Pública, especialmente aqueles que lhes privassem do
exercício das funções até então desempenhadas. Mesmo porque a sociedade, à época, já
protestava pela imparcialidade e isenção das autoridades administrativas, buscava-se uma
máquina administrativa que não fosse casuísta, sendo, portanto, necessário, que aos
funcionários públicos fosse garantido o mínimo de proteção no desempenho de suas funções
para o seu exercício com imparcialidade e sem o temor da demissão ou exoneração.
54. Esta proteção remonta à Carta Constitucional de 1934, sendo renovada e
alterada na Constituição de 1946, de 1967 e consagrada pela de 1988, que fixou em três anos, o
tempo de exercício necessário para adquirir-se a estabilidade. O instituto, portanto, é uma
garantia do Estado, da sociedade e não do servidor público, na medida em que assegura aquele
que exerce a função pública, ocupante de cargo de provimento efetivo, que não sofrerá
qualquer sanção por desempenhar suas atribuições funcionais com impessoalidade e
moralidade, ainda que desagrade setores da própria Administração ou particulares. Tal garantia
impede que o servidor seja demitido discricionariamente, sendo contratado ou nomeado outro
em seu lugar, situação que não ocorre com as funções de confiança.
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55. Afigura-se temerário o desempenho das atividades-fim da Administração
Tributária, como a fiscalização, lançamento, arrecadação de tributos e julgamento de processo
administrativo-fiscal pelos ocupantes das funções de chefia, assessoramento e direção. A uma,
porque como afirmado anteriormente, tal condição gera evidente desvio de finalidade na
criação da função de confiança, que não se presta, na conformidade constitucional, ao
desempenho das atividades privativas de AFRFB; a duas, porque destituídos da estabilidade
que a Constituição Federal reserva aos agentes públicos ocupantes de cargo de provimento
efetivo, os investidos nas funções comissionadas podem ser exonerados dessas a qualquer
tempo pela Administração Pública, sem necessidade de motivação, encontrando-se expostos a
pressões e interesses políticos, sem qualquer salvaguarda legal quanto aos critérios para
exoneração.
56. A cautela que se almeja ao não permitir que ocupantes de funções de confiança
desempenhem outras atividades que não as de assessoramento, chefia e direção, como as
atribuições privativas das autoridades administrativas tributárias (AFRFB) é a atenção aos
Princípios da Moralidade e Impessoalidade que devem nortear a atividade da Administração
Pública, de forma a resguardar o interesse público.
CONCLUSÃO
57. A recente alteração da SRFB é um marco importante para os AFRFB. É o
momento que a Categoria deve lutar pela recuperação e manutenção de suas atribuições
funcionais, no sentido de assegurar que a Lei n. 10.593/02, que dispõe sobre as atribuições
funcionais dos AFRFB, seja executada fielmente, já que o suposto detalhamento das
atribuições do cargo de AFRFB, previsto no Decreto n. 3.611/00, materializado no antigo
Regimento Interno da SRF pelo Secretário da Receita Federal do Brasil redundou num poder
regulamentar abusivo, disciplinando o que a lei e o decreto não previram.
58. Ressalte-se que o atual Regimento Interno da SRFB, aprovado pela Portaria
MF n. 95/2007, objeto dessa análise, mantém a usurpação das atribuições funcionais dos
AFRFB, e procura mascarar a ilegalidade indicando que os Delegados e Superintendentes farão
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o gerenciamento e a modernização da Administração Tributária, quando na verdade estão
pretendendo desempenhar atividades das autoridades administrativas tributárias, previstas no
Código Tributário Nacional, que são próprias dos AFRFB.
59. Embora sejam evidentes as inconstitucionalidades e ilegalidades no Regimento
Interno da SRFB no que se refere à avocação de atribuições privativas dos AFRFB, ao poder
regulamentar abusivo, à supressão de instâncias na SRFB, é válido ressaltar que devem ser
observados os princípios da razoabilidade e da eficiência, a fim de garantir o funcionamento da
Administração Pública, a bem da sociedade.
60. A análise do Departamento Jurídico se restringiu a averiguação de
inconstitucionalidades e ilegalidades contidas no Regimento Interno da SRFB, especialmente
quanto à violação dos princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, probidade
administrativa e eficiência na edição de ato administrativo normativo (regimento interno), com
dispositivos nitidamente nulos, na medida em que o administrador público legislou para
atender interesses outros, e por conseqüência afrontou o princípio maior da Administração
Pública, a supremacia do interesse público sobre o privado.
61. Observe-se que não cabe ao Poder Judiciário se imiscuir nas atividades atípicas
do Poder Executivo, como a legislativa, tendo em vista o princípio constitucional da separação
dos poderes; todavia, o Poder Judiciário procede à análise formal do ato administrativo, a fim
de constatar a existência ou não de vícios de nulidade sob o aspecto de sua nulidade, sem que
isso implique ofensa ao princípio da separação dos Poderes do Estado.
62. Os tribunais recentemente têm se posicionado politicamente frente às
ilegalidades praticadas no âmbito do Poder Executivo, a fim de preservar a continuidade do
serviço público, relativizando os princípios constitucionais da Administração Pública.
63. A Turma Suplementar do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, na Apelação
Cível n. 1999.01.00.16085-5, nesse sentido decidiu: “A atividade judicial, sendo função de
natureza política, não é presidida somente pela ética das convicções, mas também pela
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ética da responsabilidade (Max Weber). As possíveis conseqüências da decisão judicial
não podem ser ignoradas pelo juiz, ao interpretar/aplicar a lei. O controle jurisdicional
da Administração Pública examina, entre outros aspectos, a adequação entre a conduta
administrativa e os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, derivados – no
plano constitucional – dos princípios do devido processo legal (art. 5º, LIV) e da eficiência (art.
37). Ademais, aqueles estão explicitamente consagrados pela Lei nº 9.784/99. Por
conseguinte, a atuação jurisdicional deve guiar-se, ela própria, pelos princípios da
proporcionalidade e da razoabilidade (...).”
64. Assim, e por todo o exposto, diante das flagrantes inconstitucionalidades e
ilegalidades apontadas na presente análise, o Departamento Jurídico opina no sentido de que
há viabilidade jurídica para a propositura de medida judicial visando assegurar as prerrogativas
dos AFRFB.
65. Recomenda-se, contudo, que a impugnação seja pontual, com a especificação
da atribuição violada e a repercussão de tal violação no desenvolvimento das atividades da
Administração Tributária. Para tanto, é imprescindível que, a partir dos fundamentos jurídicos
demonstrados na presente análise, a categoria subsidie o corpo jurídico apontando quais as
atribuições privativas que pretendem ser reconhecidas como usurpadas no atual Regimento
Interno, para que se pleiteie judicialmente a nulidade do dispositivo regimental, e ainda, para
evitar, conforme já alertado nessa conclusão, que o Poder Judiciário se esquive em razões
políticas para declarar o direito, como já visto no Supremo Tribunal Federal, no julgamento da
constitucionalidade da taxação dos inativos.
É o parecer, s.m.j.
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Liliane Marins Diniz Isabel Cristina Arriel de Queiroz
Advogada - OAB/DF 14.640 Advogada - OAB/DF 22.533
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Priscilla Medeiros de Araújo Baccile
Advogada-gerente - OAB/DF 14.128