Emenda 3 - subterfúgio para retirar direitos dos trabalhadores

03 Jul 2007
Apresentada ao Projeto de Lei que criou a Super-Receita, a Emenda 3 proibia agentes do Estado, mais especificamente os Auditores Fiscais do Trabalho, de desconstituírem empresas que, na verdade, configurem relações de trabalho. Uma vez vetada pelo presidente da República, agora, discute-se a derrubada ao veto ou a apresentação de uma solução alternativa. Na visão do SINAIT, o que está por trás da discussão sobre a Emenda 3, na verdade, é o desejo de representantes de empregadores de precarizar as relações de trabalho, aprovando medidas que venham retirar direitos dos trabalhadores. Essa discussão é apenas um subterfúgio utilizado por alguns parlamentares para fazer valer os interesses dos empregadores, que sempre estão de olhos bem abertos procurando qualquer oportunidade para reduzir seus custos com a folha de pagamento e, com isso, desrespeitam os direitos dos trabalhadores que, nos últimos anos, já vêm contabilizando inúmeras perdas. O artigo publicado, em 26-6 na Gazeta Mercantil (abaixo), defende a “discussão sobre o peso tributário incidente na contratação de pessoal e a conveniência da manutenção da universalidade da proteção trabalhista nos termos atuais”. No entendimento do SINAIT, essa discussão é imprópria porque leva à defesa dos interesses dos empregadores em detrimento dos interesses da classe trabalhadora, que é reconhecidamente a parte mais fraca nessa relação. O Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho defende a manutenção e ampliação desses direitos e, por isso, repudia veementemente qualquer iniciativa que pretenda retirar direitos históricos duramente conquistados pelos trabalhadores. 26-6-2007 – Gazeta MercantilArtigo – O fiscal, o juiz e a Emenda nº 3Ricardo Lodi Ribeiro É hora de abrir um debate conclusivo sobre os custos de contratação de pessoal. Nas últimas semanas, em razão do veto do presidente Lula à Emenda n 3 apresentada contra lei que criou a Super-Receita, que não permitia a fiscalização de promover a desconsideração, senão precedida por decisão judicial, das pessoas jurídicas, atos ou negócios que estabelecem relações de trabalho, com ou sem vínculo empregatício, as classes empresariais e os profissionais liberais vêm se mobilizando pela derrubada do veto, enquanto os trabalhadores e agentes fiscais, juízes e promotores do Trabalho, pela sua manutenção.Os primeiros alegam que só ao Poder Judiciário cabe desconsiderar os negócios jurídicos praticados pelas partes, enquanto os últimos sustentam que a emenda protege o trabalho escravo e a fragilização das relações de trabalho.No entanto, a polarização dos argumentos esconde uma questão mais ampla que não está vindo à superfície. É a inadequação da atual proteção trabalhista, concebida para os empregados de menor poder aquisitivo, às faixas salariais mais altas, compostas por pessoas que não estão dispostas a ganhar menos em troca dos benefícios estatais.Porém, em vez de a discussão caminhar para a busca de uma solução geral, sustenta-se a manutenção do status quo baseado na mentira: as empresas fingem que contratam empresas e os trabalhadores brincam de empresários ou, em alguns casos, de sócios minoritários dos seus empregadores, dentro da lógica do salve-se quem puder em relação ao peso da insuportável carga tributária incidente sobre os salários.Os defensores da Emenda n 3 alegam que só o Poder Judiciário poderia desconstituir atos praticados pelos particulares, em nome da autonomia da vontade, da segurança jurídica e da liberdade. Contudo, é preciso deixar claro que a prestação jurisdicional só é provocada quando acionada por um dos interessados. Assim, na prática, só haverá decisão judicial por iniciativa de uma das partes dessa relação simulada, o que só irá acontecer se o trabalhador for mandado embora e tiver a coragem de se voltar contra uma sistemática que domina o mercado em que ele deve buscar recolocação, o que raramente ocorre.A conseqüência dessa estratégia, que se destina a impedir abusos do fisco, é a ocultação da realidade por baixo de empresas que não existem senão no papel. Se a função fiscal é destinada à pesquisa da realidade fática, independentemente da abstração da forma contratual adotada pelas partes, os que a exercem podem e devem desconsiderar situações jurídicas que se distanciam do mundo concreto.Caso a interpretação do fiscal quanto aos fatos e ao direito não corresponda ao que o cidadão entende como correto, este poderá se valer dos mecanismos de defesa, seja na órbita administrativa, seja na esfera judicial. Aí, sim, entra o juiz, que tem o poder de verificar se os atos do fiscal foram abusivos ou não. O que não é possível, sob pena de incentivar a manutenção do engodo, é deixar à exclusiva vontade das empresas contratadas a eleição sobre o pagamento dos tributos e o atendimento de direitos trabalhistas previstos em lei.Isso é o que recomenda o estado democrático de direito e vem sendo praticado pela totalidade dos países desenvolvidos, sejam os do sistema anglo-saxão, sejam os de tradição romano-germânica, todos eles, subordinados constitucionalmente ao princípio da legalidade. Ao contrário do que se diz, nesse particular a nossa Constituição não se difere das outras.Se a solução da questão não passa pela proteção jurídica das situações claramente violadoras da realidade e do direito, mas pela transparência das relações jurídicas entre contratantes e contratados, e entre empresas e governo, é chegada a hora de abrir uma discussão franca, desarmada e conclusiva sobre o peso tributário incidente na contratação de pessoal, e ainda quanto à conveniência da manutenção da universalidade da proteção trabalhista nos termos atuais, que se vem mostrando cara e inexeqüível para uma sociedade que não mais suporta a carga fiscal atualmente verificada e que por isso é contrária aos interesses da maioria dos trabalhadores brasileiros, que não têm acesso a essas conquistas, mas que são chamados a custeá-las. Acreditar que é o Estado ou as empresas que financiam esse sistema é acreditar em almoço grátis, o que, já se viu, não existe, pois é o salário do trabalhador que sustenta todo o sistema, cujos benefícios nem sempre recebe. Se o custo é certo, o benefício cada vez mais duvidoso.