Reforma trabalhista, qual?

13 Jul 2007
(*) Cláudio José MontessoEm recente entrevista ao jornal Valor Econômico, o presidente Lula mais uma vez sinalizou com a necessidade de reformas e incluiu, entre elas, a reforma trabalhista. Em diversos momentos, setores da mídia, economistas, políticos e outros menos cotados sempre sinalizam com a necessidade de reforma trabalhista. Os argumentos de todos - ou quase todos - é que, sendo uma legislação de 1943, a CLT precisa ser modificada em face da evolução que o mundo do trabalho sofreu, particularmente no campo tecnológico e das comunicações. Outro argumento questionável é a necessidade de se inserir os trabalhadores informais e para isso é preciso mudar as leis de proteção. Ou seja, para inserir o desprotegido, é preciso desproteger a todos. Mas nenhuma das pessoas que sustentam a necessidade de reformulação da legislação indica claramente quais seriam as mudanças pretendidas em uma eventual reforma. Dizer simplesmente que a legislação é antiga não basta. Apesar da CLT datar de 1943, as leis trabalhistas foram as que maiores mudanças sofreram nesse período, inclusive quanto aos direitos dos trabalhadores. A principal delas, e maior golpe na proteção ao trabalho, foi a instituição do regime do FGTS sob a pecha de optativo e, posteriormente, em 1988, tornado obrigatório. Ainda considerando-se o texto constitucional, até hoje não se regulamentou o inciso I do art. 7º, que prevê a proteção contra a despedida arbitrária ou sem justa causa. Por mais que tenham ocorrido inovações tecnológicas ou avanços econômicos resultando em classes de trabalhadores mais esclarecidos, na hora de ser contratado o empregado continua necessitando da proteção legal que lhe garanta um mínimo de condições de trabalho. Essa proteção se exacerba ainda mais diante daquelas mencionadas inovações, pois colocam o empregado em condição ainda mais desfavorável. E aí ressurge a pergunta que não quer calar: o que pretendem reformar? Quando se fala em inovações tecnológicas e em avanços econômicos, na verdade tem-se o objetivo de justificar propostas de flexibilização das normas de proteção e ampliar as formas de contratação precarizantes e cada vez mais disseminadas na nossa sociedade, como a praga da terceirização, que tanto mal faz aos setores privados e mais ainda ao setor público, a contratação por cooperativas fraudulentas ou o eufemismo para a ilegalidade, transformando trabalhador em pessoa jurídica. Quando se sustenta que a legislação é antiga, é para dizer que a novidade é a autonomia da vontade das partes, quando nem mesmo os liberais do século 19 acreditavam quer ela fosse plena diante das condições desiguais entre os empregados e o empregador. Quando se afirma a necessidade de inserir trabalhadores informais, não é para criarmos mais vagas com carteira assinada, mas sim para eliminar a própria carteira assinada. Oque alimenta a informalidade é a pirataria, o contrabando e o desrespeito à propriedade intelectual. Mas ninguém em sã consciência defenderia que, para sanar esses problemas fossem flexibilizadas as normas que tratam daqueles assuntos. Pela lógica deles, o trabalho se insere apenas como mercadoria e um custo na produção, negando-lhes o direito de serem considerados como seres humanos. Pela lógica dos supostos empreendedores, trabalhador com direitos atrapalha. No momento em que o peso dos salários na riqueza nacional vem sendo reduzido ano a ano, é leviano pretender a redução de direitos da classe trabalhadora, sob o argumento de que só assim serão criados mais empregos. Afinal, o País precisa decidir se quer construir uma sociedade de cidadãos ou de meras mercadorias. ________________________(*) Cláudio José Montesso é presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra)