Opinião - Contas públicas no mesmo compasso
A novidade é o aumento da receita de impostos vinculados à importação Rogério Mori Os resultados das contas públicas do primeiro semestre seguem, a rigor, a perspectiva de ajuste fiscal predominante na economia brasileira dos últimos anos. Nesse contexto, desde fins de 1998, a opção brasileira foi por um ajuste fiscal centrado do lado do aumento da arrecadação, sem maiores esforços do lado dos gastos. A gestão patrocinada pelo Ministério da Fazenda em nada mudou essa estratégia no primeiro mandato do Presidente Lula. Na verdade, houve um aprofundamento, com um brutal aumento da carga tributária, que, analisando-se em retrospectiva desde fins da década passada, já se assemelha em termos de proporção ao registrado nos anos 1960 a partir da reforma tributária promovida pelo regime militar no período. O debate sobre a natureza do ajuste fiscal durante o período eleitoral em 2006 teve um fim em si mesmo e o primeiro semestre do ano mostrou-se contundente e revelador em uma perspectiva em que nada foi alterado em termos de estratégia de ajuste e os gastos da União seguiram crescendo ao longo desse período. A análise detalhada do resultado do primeiro semestre do ano também aponta alguns elementos relevantes no contexto econômico atual. Sob essa perspectiva, a arrecadação de impostos vinculados às importações mostrou considerável crescimento (17,5% no caso do imposto de importação e 21,4% no caso do IPI vinculado à importação em termos reais), refletindo a dinâmica das importações do período ante o cenário cambial predominante e de retomada do crescimento econômico. O conjunto da arrecadação, em linhas gerais, também mostrou um desempenho surpreendente para o período e o crescimento real da arrecadação (incorporando a receita previdenciária) foi de 10% sobre o mesmo período do ano passado. Em termos nominais, o salto na arrecadação do primeiro semestre do ano foi de R$ 33,6 bilhões em relação ao mesmo período do ano passado. É interessante observar que, dado que não se espera que a economia brasileira cresça muito acima de 4% neste ano, caso a trajetória da arrecadação se mantenha para os próximos meses, um novo aumento de carga tributária deve ser verificado em 2007 (a exemplo do que vem ocorrendo sistematicamente ao longo dos últimos anos). Apesar desse surpreendente resultado do lado da arrecadação, o salto do lado do resultado primário do governo central, que engloba o Tesouro Nacional, a Previdência Social e o Banco Central (BC), foi muito menos fabuloso do que os números da arrecadação poderiam ensejar. De fato, o resultado primário do governo central registrou crescimento de apenas R$ 5,6 bilhões nos primeiros seis meses do ano em relação ao mesmo período de 2006 segundo os dados do BC. A razão para esse resultado não é nenhuma outra senão uma forte expansão das despesas que, segundo dados do Tesouro Nacional, cresceram 12,7% no período. Não houve uma pressão específica que orientasse essa dinâmica do lado dos gastos, uma vez que tanto os benefícios previdenciários, as despesas com pessoal e de custeio e capital cresceram a um ritmo relativamente similar. Ainda assim, a análise do resultado do setor público como um todo para os primeiros seis meses de 2007 revela um resultado interessante. Segundo os dados do BC, o superávit primário do setor público do primeiro semestre foi de R$ 71,7 bilhões, ficando R$ 14,5 bilhões acima do registrado para o mesmo período de 2006. O destaque é que grande parte desse salto deveu-se ao resultado dos governos regionais, em particular dos estados, cujo superávit primário registrou crescimento de R$ 7,7 bilhões em relação ao total verificado no primeiro semestre do ano passado. A partir desses números, o resultado primário do setor público como proporção do PIB no período foi de 5,90%, bem acima da meta especificada. A exemplo do ocorrido em anos anteriores, é de esperar que essa proporção decaia ao longo dos próximos meses. A síntese dos elementos apontados sugere praticamente nenhuma mudança em termos de orientação da política fiscal em 2007. Adicionalmente, a expansão dos gastos segue de forma robusta, não havendo, à primeira vista, maiores reorientações em termos estruturais no conjunto. Rogério Mori - Professor e coordenador de Macroeconomia Aplicada (Cemap) da FGV/EESP. Próximo artigo do autor em 22 de agosto