Yeda propõe aumento de alíquotas de ICMS
João GuedesMarcado por medidas amargas como o aumento de ICMS sobre energia e combustíveis, o pacote de medidas para conter o déficit do Estado chegou ontem à Assembléia Legislativa e deve exigir um pesado esforço do Piratini para garantir a sua aprovação. Composto por seis projetos de lei e um decreto, o conjunto de medidas foi apresentado ontem pela governadora Yeda Crusius, depois de uma semana em que o núcleo do governo se mobilizou para angariar apoio do empresariado, servidores e parlamentares à proposta. Os textos ainda englobam medidas como a criação de uma Lei de Responsabilidade Fiscal Estadual (LRFE), revisão de incentivos fiscais, instituição de novas isenções de ICMS, corte de cargos em comissão e a venda de imóveis públicos.O pacote é capitaneado pelas duas propostas encaminhadas em regime de urgência. A que cria a LRFE, estabelecendo limites para o aumento de despesa nos três poderes, e a que determina o incremento da alíquota básica de ICMS de 17% para 18%, além de reajustar os impostos que incidem sobre telefonia, óleo diesel e outros produtos. A proposição também inclui a revisão de incentivos fiscais e a criação de novas isenções tributárias.Por conta do pedido de urgência na tramitação, os deputados têm 30 dias para avaliar os dois projetos principais. Depois disso, a pauta ficará trancada enquanto os textos não forem levados à votação. O aumento de imposto previsto no projeto deve ser a principal fonte de negociação. Mesmo com maioria na Assembléia, o Piratini precisa contornar a resistência de parte dos 32 deputados governistas. Além disso, terá de enfrentar a oposição do empresariado e da população em relação à majoração de imposto.Embora apresentado em separado em relação ao restante do pacote, a mudança nas alíquotas é considerada fundamental pelo Piratini. "Com a aprovação do aumento do ICMS saberemos o valor final que teremos para 2008", ressalta Yeda. Para garantir êxito, o governo aposta numa argumentação baseada na apresentação de medidas como o corte de 30% no custeio em 2006 e as outras propostas do pacote, que preconizam um maior controle do gasto público.O secretário da Fazenda, Aod Cunha, destaca que atual crise das finanças do Estado é resultado de mais de 30 anos de sucessivos orçamentos deficitários, antes cobertos com rendimentos da inflação, saque dos depósitos judiciais e privatização de estatais. Se aprovado, o aumento de imposto deve garantir uma receita extra de R$ 979 milhões. Com isso, a arrecadação prevista para 2008 ganharia um incremento de 7,8%, chegando a R$ 13,7 bilhões. No conjunto das medidas, o déficit inicialmente estimado em R$ 1,3 bilhão poderia ser reduzido a R$ 550 milhões no próximo ano, de acordo com Aod.Oposição compara projeto a planos de Britto e RigottoMaior bancada de oposição na Assembléia Legislativa, o Partido dos Trabalhadores (PT) divulgou nota em que compara o pacote de medidas apresentado pela governadora Yeda Crusius a propostas editadas pelos governos de Antônio Britto e Germano Rigotto. "Os projetos ressuscitam alternativas já adotadas pelos ex-governadores Antônio Britto e Germano Rigotto e que se mostraram ineficazes para equilibrar as contas públicas", enfatiza o comunicado."O carro-chefe do pacote é o aumento de impostos, que foi reiteradamente negado pela governadora na campanha. Não há outro nome para isso a não ser estelionato eleitoral", reforça o deputado Fabiano Pereira (PT).O líder da bancada do PSB, deputado Heitor Schuch, criticou o pacote e se disse contrário a "qualquer projeto que venha penalizar a população gaúcha". "Se os deputados ouvirem o clamor da opinião pública, o pacote não tem nenhuma chance de passar na Assembléia", acredita. O deputado Márcio Biolchi, líder do PMDB na AL, afirmou que a bancada fará "um exame minucioso do conjunto de projetos e preferiu não adiantar uma posição sobre a proposta". Neste instante não há como definir que estejamos a favor ou contra. O PMDB traçará sua decisão em cima da responsabilidade que tem junto à sociedade gaúcha, nem só aquilo que seja de interesse do governo ou do próprio partido, mas sim em relação ao que for melhor para o Estado", destacou.Revisão de incentivos e consumo cidadãoO Piratini propôs corte de 15% nas desonerações administradas pelo Estado. Em 2008, a redução deve representar R$ 150 milhões a mais no caixa. O valor equivale a 2,3% do total dos R$ 6,6 bilhões em desonerações concedidas pelo Estado no passado. A maior parte dessas isenções, no entanto, é determinada por lei federal e não pode ser modificada pelo governo gaúcho. Podem ser alterados apenas os benefícios concedidos por decretos e leis estaduais. O texto estabelece: redução de 30% nos créditos presumidos corte no crédito presumido do serviço de transporte de passageiros, aumentando a carga de ICMS do setor de 2,4% para 7% revogação dos créditos presumidos das entradas no fornecimento de alimentação por bares e restaurantes extinção do Programa Pró-Produtividade (Lei nº 9.675/92), em função do atingimento de níveis adequados de produtividade agrícola no Estado limitação de apropriação cumulativa dos benefícios federal e estadual para a culturaO tamanho do corte2008 = R$ 150 milhões2009 = R$ 100 milhões2010 = R$ 100 milhõesCriação do programa consumidor cidadão:O projeto determina a instituição de um sistema de devolução aos consumidores de 20% do ICMS pago nas compras de bens e serviços. A expectativa é de que entre em vigor no segundo semestre de 2008. O ressarcimento poderá ser feito por dedução no valor do IPVA depósito em conta corrente crédito do valor no cartão crédito do contribuinteConstituição do Fundo Estadual de Combate e Erradicação da Pobreza:O governo pretende usar 2% do resultado do aumento das alíquotas de produtos supérfluos (cerca de R$ 30 milhões) para formar um fundo ao financiamento de ações de natureza social e de infra-estrutura nas áreas de alimentação, habitação, saneamento, saúde, educação, assistência social e emprego.Redução de taxas e benefícios fiscaisA proposta inclui um conjunto de isenções e de abatimentos de impostos estaduais. Se aprovadas, as medidas devem provocar uma desoneração de R$ 130 milhões no ano que vem. Como o corte de incentivos fiscais será de R$ 150 milhões em 2008, na prática o governo vai acabar realocando incentivos tributários. Entre as proposições estão: retomada parcial do Simples Gaúcho, com isenção de ICMS para microempresas com faturamento de até R$ 240 mil. As micro e pequenas empresas com receita anual entre R$ 240 mil e R$ 2,4 milhões, contempladas pelo antigo simples regional, seguem sem o benefício. isenção de ICMStijolos produzidos com cinzas de carvão mineral, retroescavadeiras, motoniveladoras e outras máquinas agrícolas adquiridas por municípios, concreto pronto, máquinas para irrigação agrícola e fornecimento de refeições por restaurantes populares. isenção de IPVAônibus e microônibus para transporte seletivo metropolitano e veículos cedidos em comodato para órgãos da administração pública. crédito presumido de ICMSde 2% para o feijão nas saídas interestaduais de 10% para o extrato de tomate redução de base de cálculo de ICMS energia elétrica residencial e rural até 50kwh tubos e manilhas (de argila ou barro) e tijoleiras e tapa vigas de cerâmica redução de alíquota de ICMS rotisseria: de 17% para 12%areia: de 17% para 12%sardinha e atum enlatados: de 17% para 12%estruturas metálicas para aconstrução de redes de transmissãode energia elétrica e de comunicação: de 17% para 12%querosene de aviação para aeronaves de pequeno porte: de 17% para 13% inclusão na cesta básica de ICMSwaffles e wafersfarinha de trigo com fermentopolvilho e amido de milho diferimento de ICMSpetróleocentrais de compras, nas vendas para associadosElevação de impostos não é solução para crise, afirma FeijóLogo após o anúncio das medidas, o vice-governador do Estado, Paulo Afonso Feijó, divulgou carta na qual destaca que "o aumento da carga tributária é a causa de crises econômicas e não a solução para elas. Aumentar impostos significa reduzir empregos, significa tirar competitividade do Rio Grande do Sul e mandar mais empresas e empregos embora".Segundo Feijó, no que diz respeito à elevação de tributos, nem ele nem o seu partido, o Democratas, podem se posicionar favoráveis. Conforme o vice-governador, o Estado perde competitividade há 20 anos, com "empresas gaúchas saindo daqui a cada mês e indo se instalar em outros estados, em outro país, porque ninguém agüenta pagar mais caro por um produto por ele ser fabricado no Rio Grande do Sul". De acordo com ele, os governos que passaram pelo Piratini possuem uma visão "fiscalista, tornando mais caro o que é produzido aqui".Feijó afirma, no documento, que é necessário visualizar o ICMS per capita dos Estados. "Ele mostra o quanto cada gaúcho, mineiro, carioca, paranaense e catarinense está pagando, efetivamente, de ICMS em seus estados". No Rio Grande do Sul, conforme o vice-governador, cada habitante para R$ 1.168,20 por ano. A média brasileira é de R$ 1.004,00. Os catarinenses pagam R$ 1.140,00, os cariocas, R$ 1.036,00; e os paranaenses, R$ 980,00. "Os gaúchos pagam o equivalente a 30% do salário mínimo líquido só com o ICMS", destaca.O vice-governador ressalta que algumas das medidas são defendidas por ele e seu partido como, por exemplo, as proposições em relação ao regime de previdência para os novos servidores, a previdência complementar. "A Lei de Responsabilidade Fiscal Estadual é uma bela iniciativa que pode servir de exemplo para o resto do País. O pagamento de precatórios é justo", diz. "A governadora poderá contar conosco na defesa destas medidas que consideramos não só necessárias como imprescindíveis para a modernização do Rio Grande do Sul."Controle de custos e gestãoResponsabilidade fiscalEncaminhado com pedido de urgência pelo governo, o projeto é considerado um complemento à Lei de Responsabilidade Fiscal nacional. A idéia é conter a escalada dos gastos com pessoal, que cresceram 86,8% entre 2000 e 2006, chegado aos R$ 9,6 bilhões. O texto prevê criação de limites para crescimento na despesa com pessoal e de custeio para todos os poderes proíbe o governo de conceder reajustes salariais para serem pagos pela administração seguinte impede a concessão de novos incentivos fiscais nos últimos seis meses de mandato do executivo Extinção de Cargos em Comissão (CCs)O governo vai extinguir 761 cargos em comissão (CCs), que correspondem a 80% dos postos de confiança vagos. A medida impede o Estado de nomear funcionários para esses cargos, que representam uma despesa anual de R$ 8 milhões. Ao todo, o Estado mantém hoje cerca de 4 mil CC´s.Decreto de GestãoAlém dos projetos de lei, o governo do Estado publica hoje um decreto que organiza sistemas de gestão no Executivo. De acordo com a governadora, o texto dará funções ao Programa Mais com Menos e aos gerentes dos programas de governo contidos no Plano Plurianual. O texto também permite a criação da Escola de Governo, institui a carreira de gestor público e cria o Comitê de Governança Corporativa das Estatais.Empresários reclamam da correção de tributosEntre os representantes do setor produtivo e políticos prevalece a reclamação contra a elevação das alíquotas de ICMS. A Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs) alerta que o verdadeiro impacto da proposta do governo de elevação do ICMS é muito maior do que parece. Segundo a entidade, o acréscimo da alíquota básica de 17% para 18% significa um aumento de 5%. Já o reajuste da energia elétrica comercial será de 20%. Entre os campeões de majoração está o Gás Natural Veicular (GNV) que terá um impacto de 108,3% ao passar o ICMS de 12% para 25%. O presidente da Fiergs, Paulo Tigre, afirmou que "os aumentos atingirão toda a sociedade". Ele reclama que falta definir a cronologia dessas medidas. "Normalmente quando os governantes propõem pacotes, a elevação dos impostos já ocorre em 90 dias, mas o corte das despesas são intenções que acabam não se concretizando", lamenta o industrial.Segundo Tigre, os empresários discordam do cálculo de que as desonerações atinjam o valor de R$ 6,5 bilhões e sejam a causa do déficit público. "Deve ser mostrado com clareza à sociedade que existe a necessidade de equalização das alíquotas praticadas com outros Estados, e o enfrentamento da chamada ´guerra fiscal´, para não perdermos competitividade e empregos", argumenta. O presidente do Sinplast/RS, Jorge Cardoso, afirma que a posição do sindicato segue a da Fiergs. "Sabemos do esforço do Estado em reduzir seus custos e suas despesas, mas continuamos enfatizando que esse trabalho deve ser feito primeiro dentro do próprio Estado. Isso pode ser realizado com avaliação de custos, despesas e de onde se pode reduzir o dispêndio do Estado", salienta. O presidente da Federasul, José Paulo Dornelles Cairoli, disse que a proposta do governo de ampliar a carga tributária prejudica o desenvolvimento do Estado, leva à informalidade e provoca desemprego. A Federasul classificou como "equívoco" a proposição de aumento das alíquotas do ICMS. Para Cairoli, a sociedade não suporta mais pagar uma conta "tão alta, com retorno pífio e, o que é pior, sem solução para os problemas das contas públicas". Ainda de acordo com o dirigente, "se olharmos para trás, veremos que três dos últimos quatro governos aumentaram as alíquotas do ICMS, e mesmo assim as finanças públicas se deterioraram no Estado. Por isso, não acreditamos nessa solução", enfatizou o presidente da Federasul. Cairoli considerou positivas outras medidas anunciadas no plano, como a Lei de Responsabilidade Estadual. "Reduzir gastos mais drasticamente é a primeira saída que o Estado precisa adotar com firmeza, coragem e determinação", completa Cairoli. Os produtores de carne de frango, suínos e leite estão preocupados com as medidas. Entidades como Asgav, Sips e Sindilat reclamam das manifestações do governo do Estado contra os créditos presumidos do ICMS outorgados às cadeias produtivas. As entidades consideram que "embalado pela desinformação, o governo faz a opinião pública acreditar que se tratam de "benefícios fiscais", cujo grande privilegiado é o empresário. Os produtores ponderam que esses créditos estão aquém da necessidade real e são paliativos contra a guerra fiscal travada no plano econômico e cujo resultado depende basicamente da competitividade dos setores. Segundo eles, a produção gaúcha de aves, suínos e leite depende de matéria-prima, milho e soja provenientes do centro do País. "Neste cenário, a questão dos impostos representa mais um agravante para os produtores", lamentam as entidades.Previdência e precatóriosRegime de aposentadoria:A proposta determina a criação de um novo sistema de aposentadorias dos servidores e estabelece um novo órgão gestor para a previdência pública estadual. O novo regime previdenciário deverá ser utilizado por todos os funcionários públicos contratados a partir de sua criação. O sistema deve ter como base um fundo, abastecido por contribuições dos servidores e do governo do Estado. Para arcar com sua parte, a Fazenda vai sacar mensalmente recursos do Fundo de Garantia da Previdência Pública Estadual (FG-Prev), criado com 10% dos recursos obtidos com a oferta secundária de ações do Banrisul. O objetivo é reduzir o déficit previdenciário do Estado, que hoje supera os R$ 4 bilhões anuais.Retomada de pagamentos de precatórios:Com um estoque de precatórios a pagar superior a R$ 3 bilhões, o Piratini encaminhou projeto que reorganiza a alocação de recursos para a quitação desses títulos, que não estão sendo honrados com regularidade. A idéia é garantir fluxo de recursos para esse fim. O projeto prevê a destinação para o Fundo Estadual de Precatórios de 50% das receitas líquidas da cobrança judicial da dívida ativa 50% dos rendimentos líquidos do Sistema de Gerenciamento Financeiro 50% dos recursos da venda de imóveisVenda de imóveis inservíveis:O governo vai enviar à Assembléia um projeto prevendo a venda de 617 imóveis, avaliados em R$ 284 milhões. O montante arrecadado deve ser utilizado no pagamento de precatórios e para abastecer os fundos para a previdência criados com a venda de ações do Banrisul. O Estado já tem cerca de 300 imóveis com a venda autorizada pelo Legislativo.O destino dos recursos:50% para o Fundo Estadual de Precatórios40% para o Fundo de Equilíbrio Previdenciário (FE-Prev)5% para o Fundo de Garantia da Previdência Pública Estadual (FG-PREV)5% para o Fundo Estadual de Gestão Patrimonial