Riscos do excesso

15 Out 2007
Por Washington Castilhos, do Rio de Janeiro Agência FAPESP – A literatura científica tem mostrado que, além de ser um dos antioxidantes mais reconhecidos, por seu efeito contra a deterioração das células e o envelhecimento, a vitamina E tem potencial antiinflamatório. Agora, uma pesquisa feita no Laboratório de Imunofarmacologia do Instituto Oswaldo Cruz (IOC) da Fundação Oswaldo Cruz destacou um possível papel antagônico em processos inflamatórios, indicando que a administração de uma dosagem mais alta pode ter como conseqüência a piora do quadro clínico. Os resultados indicam que a vitamina E tem um efeito inibitório na atividade do receptor nuclear PPAR gama – proteínas existentes no núcleo das células e que são importantes na comunicação celular – somente quando administrada em baixa dosagem. “Vimos que o efeito antiinflamatório da vitamina E pode ocorrer por meio do receptor PPAR gama, porém verificamos que, quando administrada em altas doses, a vitamina não tem efeito sobre a proteína e permite a inflamação. Concluímos que o caráter antiinflamatório da vitamina seria devido ao efeito inibitório na ativação do receptor”, explicou a bióloga Adriana Ribeiro Silva, coordenadora da pesquisa que durou dois anos. Os pesquisadores utilizaram um modelo experimental em camundongos, no qual provocaram um processo inflamatório e avaliaram o efeito do tratamento com vitamina E por meio da administração de drogas utilizadas em tratamentos clínicos. Constataram que uma dose de 40 microgramas por cavidade (por animal) tem efeito antiinflamatório, mas, se a dose for aumentada para 120 microgramas por cavidade, a vitamina E tem atividade pró-inflamatória. O que chamou a atenção é que essa última dosagem corresponde a uma dose comumente prescrita para humanos. O estudo traz um alerta importante quanto ao uso indiscriminado da vitamina E. “Muitos imaginam que, quanto maior a dose, melhor o resultado. Constatamos o contrário, chamando a atenção para o cuidado com a dosagem”, disse Adriana à Agência FAPESP. A bióloga ressalta que os resultados da pesquisa são importantes porque drogas que se ligam ao receptor PPAR gama são utilizadas clinicamente e aceitas comercialmente como antidiabéticos. O próprio estudo começou com a proposta de avaliar o uso dessas drogas no tratamento da diabetes. “Nossa idéia era questionar se esses medicamentos seriam benéficos ou não, uma vez que havia indícios na literatura científica de que a ativação desse receptor poderia ter um efeito pró-inflamatório, isto é, ao tratar uma doença predispõe o indivíduo a outro efeito, alterando o seu sistema imunológico”, afirmou. A pesquisa, segundo ela, traz uma outra vantagem: “Hoje, temos dificuldade em produzir drogas que tenham efeitos desejados e não apresentem os efeitos colaterais. Cada vez mais se tem tentado encontrar alvos moleculares, como o PPAR gama, com atividades dentro da célula”, disse. A equipe do IOC pretende mostrar os efeitos adicionais ao conhecido efeito antioxidante da vitamina E e propor sua aplicação como um antiinflamatório que possa ser utilizado de forma mais ampla, inclusive em doenças com fundo infeccioso, como infecção por bactérias e outros microrganismos. O próximo passo da pesquisa será investigar as atividades pró e antiinflamatória da vitamina E com foco na sepse, doença inflamatória sistêmica que resulta da disseminação de bactérias a partir de um foco infeccioso e gera uma resposta inflamatória que pode acarretar óbito. “A idéia é avaliar com certeza o efeito dela sobre o PPAR gama, para tentar caracterizá-lo melhor como benéfico ou maléfico”, disse Adriana. Os resultados do estudo, segundo a pesquisadora corroboram com uma máxima famosa do filósofo grego Sócrates: “Nada em excesso”.