Tim Maia por inteiro
Nelson Motta entra na transgressora vida de 55 primaveras do cantor Tim Maia e apresenta uma biografia sem censura com ótimas históriasCamarada, irmão, Branco Mello convidou com todo o prazer do mundo Tim Maia para ser atração especial de um grande show dos Titãs. O roqueiro conversou, ligou. Insistiu. Próximo ao show, ouviu:- Pô, Branco... Não vou nem nos meus... (gargalhada).O Tim Maia (1942 - 1998) que emerge na biografia Vale Tudo - O Som e a Fúria de Tim Maia, de Nelson Motta (Objetiva, 392 páginas, R$ 49,90), é conhecido e saudoso. Humorista, anárquico, drogado, polêmico, transgressor, independente e cantor de voz espetacular e com um sentido rítmico único. O que nós não sabemos, e Motta conta com gosto, são as dezenas de deliciosas, hilárias e algumas chocantes histórias do síndico do Brasil.- Sou preto, gordo e cafajeste, formado em cornologia, sofrências e deficiências capilares - dizia.Nelson Motta, 63 anos, queria escrever a biografia desde 2000. Esperou sete anos por medo das ações dos herdeiros. Tim Maia nunca trafegou do mesmo lado da lei. Não pagava imposto de renda, IPTU, IPVA. Na hora dos processos, e ele teve quilos, simplesmente não aparecia na frente do juiz. Deixava rolar e perdia. Às vezes, saldava as dívidas com cheque sem fundo. Ele dizia que andava sempre com três advogados, um para cuidar do outro, todos para atender a seus escorregões. Como quando ele saía vociferando do palco, depois de uma performance não muito bem sucedida, sumindo no meio do show.- Vão vaiar a vó de vocês seus f.d.p... Não preciso de vocês. Vão para a p.q.p...O escritor descobre o biografado Sebastião Rodrigues Maia como o Tião Marmiteiro, entregador de viandas da pensão do pai no bairro Tijuca, no Rio dos anos 50. Fala do seu encontro com Erasmo Carlos, da briga com Roberto Carlos, quando os dois jovenzinhos lutavam pelo microfone de cantor do grupo Sputniks:- (...) Seu f.d.p. Eu boto você no conjunto e você vai cantar sozinho...O escritor acompanha Tim Maia, 18 anos, aos EUA, onde ele aprendeu a fumar maconha e a roubar. Pegou uma cadeia firme e foi deportado. Na bagagem encontra o diploma norte-americano do músico: o trepidante e dançante rhythm and blues de James Brown, Wilson Pickett, Ray Charles, Smokey Robinson. Mistura explosiva e inédita ao ouvido tupiniquim. O biógrafo vê o jovem Tim em busca do seu espaço na música, depois da explosão dos amigos na Jovem Guarda. Explica sua entrada em estúdios, os primeiros discos, os shows, o começo na tevê, a escalada nas paradas de sucessos, os rolos, as mulheres, os amores e as paixões, os traficantes, as viagens e a mania de deixar shows pela metade ou de não aparecer no dia contratado, nem no seguinte:- Estratégia.Tim gritava uma vez. Sua equipe sabia que era hora de dar no pé. O local era detalhe, o momento, insignificante. Ao ouvir "estratégia", todos sumiam do palco, do teatro, do hotel, do aeroporto, de qualquer lugar porque alguma coisa não estava agradando Tim.Uma das últimas performances perfeitas de Tim foi no Planeta Atlântida de janeiro de 1998. Ele morreria dois meses depois com 120 quilos, já careta, longe até do uísque 12 anos. No seu último show, em Niterói, a banda Vitória Régia atacou com Não Quero Dinheiro.- Vou pedir... Vou pedir...Ele tentou cantar. Não conseguiu. Saiu cambaleando do palco, sem ar.- Deve ter cheirado todas - disse uma mulher da platéia, sem saber.Tim Maia do Brasil morreu sete dias depois. O coração indomável parou.LUIZ ZINI PIRESSaiba mais - O que: Vale Tudo - O Som e a Fúria de Tim Maia, de Nelson Motta (Objetiva, 392 páginas, R$ 49,90)