Mensagem da Secretária da RFB , Lina Vieira, aos participantes do Seminário Público 20 anos da Constituição

26 Set 2008

Legenda: 5) Painel "Memorial da Constituinte" (esquerda para a direita): painelistas: Ibsen Pinheiro, Deputado Federal pelo PMDB; Procurador de Justiça Aposentado e Líder do PMDB na Constituinte e Plínio de Arruda Sampaio, Advogado e Promotor Público e Ex-Deputado Constituinte; Norberto Antunes Sampaio, Presidente do UNAFISCO/Delegacia Sindical em Curitiba (PR) presidente da mesa; painelistas: Olívio Dutra, Ex-Governador do Estado do Rio Grande do Sul, Ex-Deputado Constituinte pelo PT e João Gilberto Lucas Coelho, Advogado; Ex-Diretor do Centro de Estudos e Acompanhamento da Constituinte da UNB,Universidade de Brasília; Thiago Flores Schmitt, Presidente do UNAFISCO Delegacia Sindical em Uruguaiana secretário.

Os 20 anos da Carta da Cidadania Rendo as minhas homenagens aos participantes do Seminário sobre a Carta de 88. Minha calorosa saudação a todos! Aqui, antes da Secretária, fala a cidadã. Dia 5 de outubro de 1988! O país inteiro encheu-se de esperança. A esperança de todos. Que dia, aquele! Júbilo, celebração, comunhão e congraçamento que defluiam do majestático pronunciamento do Doutor Ulysses. Senti aquela esperança como uma fonte na alma. Milhões de brasileiros sentiram a mesma coisa. A minha geração embalou o sonho de um Brasil democrático, desenvolvido, livre e justo. Sonho que vem de longe; dos heróis da Independência, dos abolicionistas, dos "tenentes" da República Velha, dos revolucionários da Coluna Invicta; dos jovens libertários presos em Ibiúna. Estudantes que despejaram seu entusiasmo na travessia para o mundo moderno e buscavam o lugar do Brasil no futuro que parecia bem perto. A democracia funcionava e havia alguma perspectiva de melhoria social. A História nos surpreendeu dando um passo para trás. Dos "anos dourados" de JK saltamos no escuro para os anos de chumbo. Misturamos crescimento econômico com arrocho salarial. Sacrificamos a liberdade. Vimos o progresso para poucos. O legado de uma enorme dívida externa veio junto com inflação. As mazelas sociais, o arbítrio e a tortura do Estado ditatorial estrangularam a cidadania. Meus filhos nasceram e imaginei que nossos netos veriam o dia em que igualdade, liberdade e justiça andariam juntos com o desenvolvimento nesta terra. Cunhambebe, Zumbi, Tiradentes e Frei Tito de Alencar. Eu cheguei a duvidar que a luz desse dia riscasse minha face, mas acalentei sempre no coração a chama da esperança de que esse dia chegaria. Nunca pensei que pudesse me encontrar na posição em que hoje me encontro, para assumir a liderança servidora da SRFB. Com absoluta humildade, empenhar-me-ei para fazer cumprir o legado do Doutor Ulysses na parte que nos cabe! Os jovens que pintaram a cara reclamando a compostura dos seus representantes, assim como os da minha geração, todos aprendemos o valor da liberdade de expressão e da organização popular. A Carta de 88 consagrou-as e não podemos abrir mão delas. A Carta de 88 nos fez recuperar a confiança e nos deu esperanças. O empresariado dá sinais de que decidiu assumir sua responsabilidade social. Os trabalhadores ainda sofrem com tecnologias que disseminam o desemprego estrutural, mas procuram novos arranjos produtivos e ampla organização sindical para reivindicarem direitos e uma parte maior na torta do excedente econômico. A iniciativa dos sindicalistas no Rio Grande do Sul de promover o evento sobre a Carta de 88 é portentosa. Orgulha-me pertencer a uma categoria de trabalhadores do serviço público dotada de tamanha sensibilidade política e social voltada para as instituições nacionais, ultrapassando os limites do corporativismo estreito. Ao debater às claras o perfil atual do Brasil, depois de 20 anos da Carta da Cidadania, envolvendo membros do Executivo, Legislativo, Judiciário, Universidade, Sindicatos, Ministério Público, empresas e entidades não-governamentais, as Delegacias Sindicais do Rio Grande do Sul e demais entidades apoiadoras dão um exemplo de respeito àqueles arautos do Estado de Direito que vivenciaram um dos mais férteis períodos de participação política e social da sociedade brasileira. Algo me é muito caro. Diz respeito a tudo que aprofunde os mecanismos de integração regional e federativa, por dentro do Brasil, e partindo em direção do MERCOSUL, com vistas a identificar áreas com potencial adormecido de sinergia nas relações com estados, municípios e países fronteiriços. Não podemos esquecer das nossas relações com o continente africano e podemos aprender com países como a China, a Rússia e a Índia, cuja dimensão continental assinala desafios semelhantes em escala para perseguir o desenvolvimento econômico e social. O desenvolvimento do país reside na atenção que dá ao seu povo, na lição de Celso Furtado. A educação dentro do processo de ensino é lugar de solidariedade do meio social para formar cidadãos, na pedagogia de Paulo Freire. Não podemos tolerar o analfabetismo e o semi-analfabetismo. Só o padrão de consumo não nos moderniza. Há um mínimo indispensável de conhecimento para a condição humana. Nossa missão é facultar que essas prioridades do povo sejam atendidas com os recursos carreados ao Erário. A reorganização da máquina fazendária é parte desse processo. A administração pública deve se manter distante do clientelismo, do interesse privado e da corrupção que sangra os contribuintes, que são os beneficiários legítimos das políticas sociais. Sem uma mudança de mentalidade que exige o concurso da sociedade, o governo que tem um papel fundamental, não será capaz de cumprir o seu papel. Daí o imperativo da transparência e do controle social para que a opinião pública se mobilize e arranque as boas intenções dos discursos levando-as ao cotidiano. Assim é preciso construir outras formas de participação da sociedade para fundamentar essa tomada de consciência, da reivindicação cidadã e da mobilização capaz de sensibilizar os meios de comunicação de massa. Sem os grandes meios de comunicação, cujo papel é central na mobilização de todos, mais a independência da crítica e a veracidade da informação, os cidadãos ficam sem condições para cobrarem mais coerência na ação dos governos e incapacitados para o exercício da cidadania. Creio que duas palavras são fundamentais para entendermos a Carta de 88. Solidariedade; com as minorias raciais e algumas maiorias - os negros - que esperam igualdade na realidade. Aos grupos indígenas, aos despossuídos da terra. Dignidade; com o tratamento das crianças e dos idosos, da família, dos abandonados, torturados, portadores de necessidades especiais e humilhados. Aos convidados e participantes de tão impressionante simpósio cívico, manifesto o meu entusiasmo e respeito, porque creio que todos os cidadãos e cidadãs no Brasil, com a vigência do Diploma da Liberdade e da Justiça Social, podem ter mais fé, esperança e confiança de que um outro Brasil, mais do que possível, também tornar-se-á viável. Sinto que a respeitável Casa do Povo gaúcho, hoje, vai lavrar mais um Auto de Fé na Democracia. Muito obrigada, Lina Maria Vieira