Manifesto de Desagravo aos Servidores Fausto De Sanctis e Protógenes Queiroz

11 Dez 2008

 

Porto Alegre (RS), 24/11/2008.

 

 

Manifesto de Desagravo aos Servidores, Fausto De Sanctis e Protógenes Queiroz

 

 

Os Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil, filiados à Delegacia Sindical de Porto Alegre/RS do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal - Unafisco Sindical vêm, por meio deste, manifestar voto de desagravo ao Juiz Federal e Servidor Público Federal Fausto Martin de Sanctis e ao Delegado de Polícia Federal e também Servidor Público Federal, Protógenes Queiroz, tendo em vista as retaliações por eles sofridas no curso da “Operação Satiagraha”, desencadeada pela Polícia Federal e suas repercussões legais e processuais ulteriores, nos termos em que segue.

 

            Daniel Dantas, proprietário do Grupo Opportunity, foi preso duas vezes em julho deste ano por conta da supramencionada operação tendo em vista a existência de fortes indícios que apontavam para a prática de tentativa de corrupção ativa, entre outras. A primeira ordem foi de prisão temporária e a segunda de prisão preventiva, ambas expedidas pelo juiz federal Fausto De Sanctis, da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo.

           

            Tendo em vista pedidos do advogado de Daniel Dantas, o ministro Gilmar Mendes do Supremo Tribunal Federal – STF, concedeu dois habeas corpus ao banqueiro, um contra o pedido de prisão temporária e outro contra o pedido de prisão preventiva.

 

De profunda estranheza foi a ação movida pelo deputado federal Raul Jungmann (PPS-PE), onde se pedia a abertura de um procedimento administrativo disciplinar contra o juiz da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, Fausto De Sanctis, pedido este negado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Foi, entretanto, apresentado recurso, cujo julgamento fora adiado sob alegação de que se preferiria esperar o retorno do presidente do CNJ, Gilmar Mendes, que estava em viagem.

 

Por nove votos a um, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) confirmaram no mérito a concessão de habeas corpus que suspendeu a prisão preventiva do banqueiro Daniel Dantas, ocorrida em julho durante a realização da operação ut supra.

 

Com exceção do voto vencido do ministro Marco Aurélio Mello, a sessão foi marcada por desagravos a Mendes, críticas veementes ao juiz Fausto De Sanctis e à medida autorizada por ele.

 

Celso de Mello criticou o comportamento de De Sanctis dizendo ser “estranho o comportamento do magistrado, procurando construir em defesa de suas decisões um muro que impeça tribunais superiores de exercerem sua jurisdição. Foi um comportamento insolente e insólito, para não dizer ilícito”.

 

Peluso votou no sentido de que o STF encaminhe um pedido para que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apure as condutas do juiz De Sanctis.

 

O ministro Menezes Direito também acompanhou o voto do relator e o definiu como “uma lição primorosa para os juízes brasileiros, de que o prestígio das instituições judiciárias começa pelo respeito à Suprema Corte do país”.

 

O relator do caso, ministro Eros Grau, havia iniciado a sessão com voto favorável à manutenção do habeas corpus. "Em nome do Estado de Direito e contra o Estado autoritário" (sic).

 

Pois bem, analisados os fatos é de se concluir que cabe perfeitamente trazer à baila trecho do eminente professor Eugênio Raúl Zaffaroni, ipsis litteris, porquanto retrata perfeitamente a configuração assumida, lamentavelmente, pelo Poder Judiciário em nosso país:

 

“A chave do pode dor judiciário se acha no conceito de “independência”, mas este é, como tudo o que se relaciona com o judiciário, bastante equívoco.

 

(...)

 

            Na prática, a lesão à independência interna costuma ser de maior gravidade do que a violação à própria dependência externa. Isso obedece a que o executivo e os diversos operadores políticos costumam ter interesse em alguns conflitos, em geral bem individualizados e isolados (salvo casos generalizados de corrupção, ou seja, de modelos extremamente deteriorados), mas os corpos colegiados que exercem uma ditadura interna e se divertem aterrorizando seus colegas, abusam de seu poder no cotidiano. (Grifos nossos).

 

(...)

 

             A pressão sofrida pelos juízes em face da lesão à sua independência externa, em país democrático, é relativamente neutralizável, por via da liberdade de informação, de expressão e de crítica, mas a lesão de sua independência interna é muito mais contínua, sutil, humanamente deteriorante e eticamente degradante. Quanto menor seja o espaço de poder de uma magistratura, quer dizer, quanto menor independência externa possua, maior parece ser a compensação buscada pelos seus corpos colegiados no exercício tirânico de seu poder interno. Em uma magistratura com estes vícios é quase impossível que seus atos sejam racionais. (Grifos nossos).

 

             A independência interna somente pode ser garantida dentro de uma estrutura judiciária que reconheça igual dignidade a todos os juízes, admitindo como únicas diferenças jurídicas aquelas derivadas da diversidade de competência. Este modelo horizontal constitui justamente a estrutura oposta à verticalizada bonapartista, cuja expressão máxima foi a judicatura fascista. Deve-se logo dizer que o modelo fascista foi amplamente superado por alguns disparates originais latino-americanos.

 

              Em síntese, ambas as formas de independência do juiz – a externa e a interna – são igualmente necessárias para possibilitar sua independência moral, ou seja, para dotá-lo do espaço de decisão necessário a que se resolva conforme seu entendimento do direito. É desnecessário sobejar em considerações jurídicas e políticas que impedem que um juiz dependa do executivo ou do legislativo, caso em que, evidentemente, não se trataria de um juiz, mas de um empregado público, tendo-se porém, reparado menos na impossibilidade de que outro órgão judicial, o que converte e, um mero amanuense da cúpula burocrática”. (ZAFFARONI, Eugenio Raúl, Poder Judiciário – Crise, Acertos e Desacertos. Tradução: Tavares, Juarez. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 1995).

 

              Aos Servidores Públicos Federais, Juiz Federal Fausto de Sanctis e Delegado de Polícia Federal Protógenes Queiroz, os nossos mais profundos votos de estima e admiração, porquanto demonstraram em profundidade o quê realmente vem a ser ética e moral no desempenho da função pública.

 

 

Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil Delegacia Sindical de Porto Alegre/RS - Unafisco Sindical